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Casamento

Parcerias da música com a poética

Música será sempre música, se não houver letra; entretanto, letra não será música se estiver só

Música  –  15/03/2017 18:04

Publicada: 28/02/2017 (08:49:14) . Atualizada: 15/03/2017 (18:04:34)

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(Foto Ilustrativa)

Não existe letra solteira porque essa é poesia e não música; depois que se juntam, são inseparáveis

> Confira todas as colunas "Descobrindo a Música", assinadas pelo músico Ricardo Yabrudi

Alguns compositores são músicos e poetas simultaneamente. Alguns escultores são pintores também, acumulam duas áreas de atuação dentro da arte. Alguns jornalistas são poetas, alguns cozinheiros são nutricionistas, alguns médicos são bons psicólogos. Esse polimatismo entre áreas afins é saudável, porém, devemos ser parcimoniosos. Cuidado, aliado à eficiência, seria um padrão no mínimo obrigatório. O mesmo acontece com músicos que confeccionam suas próprias letras. Serão melhores em alguma área artística porque a paridade será quase impossível. É bem difusa a concepção de que a música é a “roupa” da letra ou a letra é a “roupa” da música. Sem se importar com essa celeuma, devemos nos atrelar a essa ideia de casamento que talvez nunca terá um fim. Existe também, sim, uma parte dos músicos que não corroboram com essa ideia de misturar as duas formas de arte. Enfim, o que é, é, e o que está posto aí está para mostrar que artistas podem ser músicos e poetas simultaneamente, e que a música tem essa “roupa linguística”.

Esse casamento teve seu início, provavelmente, nos primórdios quando alguém balbuciando palavras modulou o tom e a “oratória” se transformou em canto. Há uma possibilidade, que foi ao tocar algum instrumento primitivo o homem se atreveu a falar discursando. Provavelmente não agradando com sua fala, procurou musicalizá-la. Por outro lado, ao chorar, viu no choro um lamento melódico que, apesar da tristeza que carregava, aumentou o luto, mas apaziguou a tribo. A música se tornou ao cantar o lamento da tribo. O “spiritual” é o lamento africano típico da forma cantada dos primórdios do “blues”. Ao se lamentar da fadiga diária, à noite, cantavam chorando sua dor, e essa se transformava nas mais lindas canções, que no futuro estaria visível esse selo; a marca indelével do “blues”. O spiritual é o marco de todas as formas americanas advindas do blues, o ragtime, o jazz, e o rock.

A letra da música com a melodia musical é este casamento que ainda não sabemos quem é a noiva ou quem é o noivo. Feminino ou masculino aqui não está em questão, porém sua duração ou divórcio. Não creio em um fim, todavia, existe a música solteira: o jazz instrumental, o choro brasileiro etc. Não existe, contudo, letra solteira porque essa é poesia e não música. Ora, a música será sempre música se não houver letra, entretanto, letra não será música se estiver só.

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A música sobrevive e principalmente tem “existência”, sem uma letra, porém a letra de uma música não vive e não tem existência sem a melodia porque perderá o “campo” musical onde se sustenta. 

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Parcerias do lado musical emprestam sempre a “existência” aos poetas. O que é notório também é que as letras criam um “selo” na música. Marcam às vezes o sentido da música que às vezes não foi para aquela direção. Sambas apressados extremamente melodiosos às vezes não combinam com uma letra que fala de um amor que vai esfriando, ralentando e se acaba. Também não se falaria de dor em uma letra com uma música com ritmos acelerados. Quem é a roupa de quem? Quem serve quem? Casamento não implica em servidão, contudo, em uma parceria que ambos se emprestam mutuamente para um produto final. Essa associação produz uma “forma híbrida” que pode se desfazer quando se quiser. Vemos comumente amantes declamando a poesia de uma canção, ou este mesmo cantarolando trechos daquela canção só com a melodia.

A poética da letra remete à música e a música poderia remeter à letra. Depois que se juntam são inseparáveis. É estranho quando vemos alguma letra de música ser mudada. A “paródia” (que altera as letras, mantendo a melodia e harmonia), por outro lado é saudável e serve a outros meios de entretenimento, como o humor e as mídias em geral. A caricatura musical é saudável como em qualquer forma de arte, aliás, Arcimboldo não pintava os nobres de sua época com nariz de pera e queixo de abacate?

Este é o cenário contemporâneo, que clama por um casamento buscando a perfeição. No dia em que os poetas parceiros dos músicos entenderem essa união, compreenderão melhor a função de um indivíduo numa relação de parceria. O maior quesito talvez seja o respeito pelas formas de arte e saber promover o que esta forma possui de melhor. Encontrar o melhor parceiro talvez se traduzisse em o mais respeitoso. Ser comedido e balancear as duas formas de arte seria uma grande empreita e intenção. A poética não deveria se sobrepor à música, nem essa àquela. Já que elas estão unidas hoje devemos torcer para que sejam usadas para fins benéficos para com a sociedade. A cultura é o espelho de uma nação, e o que se ouve é o clamor ou a gratidão de um povo nas composições dos poetas e músicos.

Por Ricardo Yabrudi  –  yabrudisom@hotmail.com

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