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Movimentos Ancestrais

A arte da capoeira da Mestra Arara Durões

Antes, uma luta de sobrevivência e resistência; hoje, um esporte, jogo de perguntas e respostas, uma brincadeira onde joga-se com o outro e não contra o outro

Entrevistas  –  30/09/2013 12:22

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(Fotos: Divulgação) 

"Posso dizer que a capoeira tem um grande poder de transformação
e, claro, que também o dom e a percepção de cada um"

Encontrar Mestra Arara Durões, entre seus intervalos de trabalho, não é tarefa comum quando nos referimos ao profissionalismo dedicado à arte da capoeira, que é considerada Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil e está cada vez mais difundida no mundo. Sempre que assisto a uma roda, constato a veracidade do fascínio que tenho pelos movimentos ancestrais que sempre admirei e que minha convidada de hoje representa com orgulho todas essas histórias que aqui estão escritas. 

Tudo começou quando... 

Eu tinha 4 anos, ou seja, em 1980. Quando meu pai morreu, minha mãe começou a viajar com a gente para fazer vários acampamentos e íamos muito para praias, em Angra. Um dia vimos um cara jogando na praia e descobrimos a capoeira. Quando voltamos para Volta Redonda começamos a treinar na rua e meu irmão, por ser 11 anos mais velho do que eu, me levava em todas as rodas de capoeira e para todos os treinos. Ele foi muito bacana comigo, meu irmão Anderson Durões e, claro, minha mãe Marta de Lourdes.

Empenho de mãe... 

Depois de algum tempo treinando capoeira de rua, como chamamos, minha mãe encontrou um grupo que treinavam no Clube Municipal, ela começou a fazer as calças de capoeira, que no tempo era feita com saco de pano de chão. Treinamos um tempo nesse grupo, depois com alguns outros Mestres de Volta Redonda, Pinheiral, Barra Mansa. Depois de alguns anos meu irmão parou com a capoeira e eu continuei. 

Formação... 

Em 1993 eu me formei professora de capoeira, onde acontece uma bancada com Mestres pela Federação de Capoeira do Estado do RJ-FCERJ e o reconhecimento da minha Mestra Cigana e dos Mestres conhecidos também. Em 2011 conquistei o título de "Mestra". Quando me formei professora, fundei meu primeiro grupo, Associação de Capoeira Volta Por Cima, e que funcionou no Memorial Zumbi durante oito anos, e depois fundei a Associação de Capoeira Filhos de Mestra Cigana, que está em exercício há três anos. 

Transcendências naturais, superações e amor... 

Como a capoeira me escolheu e não eu a ela, entrou em meu corpo de forma natural e gostosa... Digo que não sei fazer outra coisa a não ser a capoeira, não sei educar sem a capoeira, não sei rir, chorar, cantar sem a capoeira. Quando sofri um acidente em 95 na capoeira, onde fiquei um ano sem andar e o médico disse que não ia mais, eu disse que duvidava dele, que eu ia voltar a andar sim. Quando isso aconteceu, mais do que nunca comecei a entender o poder que a capoeira tem, pois depois de um tempo indo de muletas aos eventos de capoeira, me dava força, uma sensação de outro mundo, de outras energias, com muita fé. E depois de um ano comecei a andar e novamente a jogar capoeira. Eu defino como arte completa, onde temos todo o corpo sendo movimentado, ritmo,música, estimulação da linguagem falada e escrita, onde eles escrevem suas músicas de capoeira, cantigas de roda, conjunto, pois não jogamos capoeira sozinho, somos coletivo mesmo, dependo do outro para eu jogar capoeira. É isso. 

Reconhecimento, arte e caminhos abertos... 

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Mestra Arara entre seus alunos; Associação de Capoeira
Filhos de Mestra Cigana está em exercício há três anos

Hoje a capoeira é nosso Patrimônio, hoje existe uma data reconhecida nacionalmente como o dia 3 de agosto, considerada o Dia da Capoeira ou Dia do Capoeirista. Existem algumas federações, como a Federação de Capoeira do Estado do Rio de Janeiro, reconhecida pela Confederação Brasileira de Capoeira e pelo COI, mas existem outras federações no Estado do Rio. Em relação aos grupos, temos sim, graças a Deus e à natureza, vários grupos em nossa região, estado e Brasil, federados e outros não. Antes tínhamos a capoeira como luta e de sobrevivência e resistência; hoje temos a capoeira e eu a vejo como um jogo de perguntas e respostas, uma brincadeira onde eu jogo com o outro e não contra o outro, por isso, vejo a capoeira como um esporte, claro com todo respeito à sua história e ancestralidade. 

Europa - Conexão com o mundo... 

Na época eu trabalhava na Smac (Secretaria Municipal de Ação Comunitária), no programa Criad, que era o Programa da Criança e do Adolescente. Como trabalhava já em alguns projetos sociais, fui selecionada entre projetos de Niterói, Rio, Paraty, São Paulo, e fui escolhida para ajudar a implementar um projeto social na Alemanha, porque acreditava que se os projetos aqui no Brasil funcionam, mesmo com pouco dinheiro, lá funcionaria melhor por ter dinheiro, verbas. Enfim, fui representando o Criad, ficando lá na primeira vez durante dois meses visitando projetos e casa sociais. 

Transformações... 

Posso dizer que a capoeira tem um grande poder de transformação e, claro, que também o dom e a percepção de cada um. Sou apenas uma ferramenta usada para divulgar e apresentar a capoeira. Posso citar um caso do Criam, que é a delegacia de menores infratores, e hoje tenho e vejo dois meninos, hoje homens, com suas famílias formadas e felizes e quando encontram comigo ou dão testemunhos e palestras sempre dizem como a capoeira os ajudou. Temos também nosso amigo Franklin Soares, o Frankão, hoje Presidente do ECFA, e reside em Portugal. Foi meu aluno aos 12 anos, quando ministrava aulas no Memorial Zumbi, era um dos mais resistentes (risos), a vista dos outros alunos que tive, e só acreditei e insisti com ele. Com o tempo ele começou a ver que toda sua vivência naquele momento com a capoeira poderia transformar sua vida, e foi o que aconteceu.Só acreditei e apresentei a capoeira pra ele. Me sinto realizada e com missão cumprida quando acontecem casos assim. 

Serviço 

> Mestra Arara Durões - Ministra aulas nas instituições, Fundação CSN-Projeto Garoto Cidadão, Instituto Dagaz, Colégio Anglo Americano, Projeto Mais Educação. Contato: arara.duroes@hotmail.com

Por Elisa Carvalho  –  elisacarvalho.br@gmail.com

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