(Fotos: Divulgação/Marco Netto)
Cia. da Ação! Teatro! Dança está acostumada a levar à cena
espetáculos de teatro-dança baseados em estética ritualista e mitologia
"O Marinheiro", de Fernando Pessoa, estreia nesta sexta-feira, 7, no Espaço Z, em Resende, e cumpre temporada até dia 23, de sexta a domingo, sempre às 21h. O preço promocional dos ingressos é R$ 10 e podem ser adquiridos no próprio local. A peça completa 100 anos em outubro e é a mais importante representante do "teatro estático", movimento inventado pelo poeta genial, dentro da estética simbolista.
A Cia. da Ação! Teatro! Dança, acostumada a levar à cena espetáculos de teatro-dança baseados em estética ritualista e mitologia, percebeu nesse texto de Pessoa uma imensa possibilidade de celebrar a vida por meio da abordagem da iminência da morte. Essa dualidade entre morte/vida, claro/escuro, sonho/realidade é o assunto primordial da dança butoh - pesquisada pela companhia - e da técnica afro-butoh, desenvolvida por Calé Miranda, seu diretor.
"Chamo teatro estático àquele cujo enredo dramático não constitui ação... Isto é, onde as figuras não só não agem, porque nem se deslocam nem dialogam sobre deslocarem-se, mas nem sequer têm sentidos capazes de produzir uma acção; onde não há conflito nem perfeito enredo. Dir-se-á que isto não é teatro. Creio que o é porque creio que o teatro tende a teatro meramente lírico e que o enredo do teatro é, não a acção nem a progressão e consequência da acção - mas, mais abrangentemente, a revelação das almas através das palavras trocadas e a criação de situações (...) Pode haver revelação de almas sem ação, e pode haver criação de situações de inércia, momentos de alma sem janelas ou portas para a realidade", está escrito em "Páginas de estética e de teoria literárias". Fernando Pessoa. (textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1966.
Peça foi escrita em 1913
Três mulheres à beira-mar velam o corpo de uma quarta. Sem saber por quanto tempo estarão em vigília, começam a contar histórias e a sonhar com um Marinheiro que teria vivido numa ilha ideal e construído uma sociedade ideal. Fantasia e realidade vão-se misturando a tal ponto que elas já não sabem mais a quem pertence o sonho. Seria o Marinheiro a única coisa real e justamente elas o sonho daquele homem?
Escrita/datada de 11 e 12 de outubro de 1913 e nunca representada em vida do autor, "O Marinheiro" foi a primeira obra que Fernando Pessoa publicou na "Orpheu", a mítica revista do movimento modernista português. Ao condensar todas as obsessões Pessoanas, "O Marinheiro" representa uma das mais fascinantes e menos exploradas máscaras da torrencial produção do autor e apesar de ser um dos mais importantes e belos textos da história do teatro e literatura portuguesa, raramente é representado. Essa obra que na teatralidade da heterónima ocupa um lugar único foi, de entre mais de 20 projetos teatrais, o único texto dramático que Fernando Pessoa completou e editou em vida e acompanhou-o ao longo da sua singular e breve existência, adaptando-o até perto da morte.
Escrita/datada de 11 e 12 de outubro de 1913 e nunca representada em vida do autor,
"O Marinheiro" foi a primeira obra que Fernando Pessoa publicou na reveista "Orpheu"
Este drama estático, teatro do êxtase, corresponde na babel Pessoana à primeira fase da sua obra e à ligação aos simbolistas e ao movimento saudosista português. Inspirado manifestamente em Maeterlinck cumpre as principais coordenadas estéticas do mentor do movimento, mas propõe-se, nas palavras de Pessoa, "fazer muito melhor".
Numa dimensão para além do espaço e tempo uma mulher conta a hitsória de um Marinheiro que, náufrago numa ilha deserta, constrói para si uma realidade ficcional mais poderosa e real do que a realidade. Presas nas teias da ficção, suspensas entre passado e futuro nessa vida maior do que a vida que é a arte, esses espectros cujas vozes se sucedem e encadeiam como numa missa coral vão tecendo um longo mantra onírico e hipnótico e construindo um rigoroso poema visual.
Na sua recusa de todas as regras básicas teatrais (ação, conflito, personagens) "O Marinheiro" é uma obra limite e provocatória e, como verdadeira vanguarda, permanece atual. A sua complexidade e jogo de espelhos meta-teatral e o modo como subverte e condensa as regras teatrais e poéticas, permanece um fascinante desafio para qualquer criador contemporâneo.
Um pouco sobre Fernando Pessoa
Fernando Pessoa nasceu no dia 13 de junho de 1888, na cidade de Lisboa. Levou uma vida anônima e solitária e morreu em 1935, vítima de cirrose hepática. Na poesia, porém, sua vida foi repleta de surpresas: foi o maior criador de heterônimos da literatura, objeto de maior parte dos estudos sobre sua vida e sua obra, e, por isso, é considerado um dos maiores nomes da Literatura Universal.
Ao contrário dos pseudônimos, os heterônimos constituem uma personalidade fictícia, sobretudo de autores. Sendo assim, Fernando Pessoa não só criou outros nomes para assinar seus textos, mas, junto deles, criou suas respectivas biografias. Essa questão resulta de características pessoais referentes à personalidade do próprio Fernando Pessoa: o desdobramento do "eu", a multiplicação de identidades e a sinceridade do fingimento, uma condição que patenteou sua criação literária.
Um pouco sobre a Cia. da Ação! Teatro! Dança
A Cia. da Ação! Teatro! Dança! participou de festivais nacionais e internacionais - na Tunísia, na Croácia e na Rússia - e ganhou prêmios. A companhia de teatro e dança criada em 1997 em Resende (RJ) desenvolve há seis anos uma pesquisa de linguagem cênica que mistura dança butoh japonesa e mitologia afro-brasileira, o afro-butoh. A companhia multidisciplinar é formada por atores, bailarinos e artistas visuais, que criam seus trabalhos a partir de investigações propostas pelos seus integrantes. A companhia produz espetáculos em site-specific, environment performances e palcos convencionais.
Com base no afro-butoh, a companhia ganhou o prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz em 2007, para a montagem de "Orelha e cogumelos", que estreou em 2008, ficou em cartaz por seis meses em Penedo. "Orelha e cogumelos" foi convidada para se apresentar no Filbleue, festival de teatro físico no Togo (África) e participou de festivais no Brasil.
Também ganhou em 2009 o prêmio Funarte Artes Cênicas na Rua para a produção em 2010 de "Orixás urbanos", série de performances e workshops para artistas em diferentes cidades do Rio. Atualmente a companhia dedica-se ao projeto Experimento Afro-butoh", onde investiga as possibilidades de environment performance, performances em ambientes naturais. Com esse experimento criou os espetáculos "Orum-Ayê-Orum", estreado em 30 de junho de 2011 no XI Fester (Festival de Teatro de Resende) e no Festival de Inverno da Mantiqueira; e a performance "Na encruza".
Quem é quem no espetáculo
. Título: O Marinheiro
. Autor: Fernando Pessoa, 1913
. Direção, cenografia e iluminação: Calé Miranda
. Elenco: Carla Biolchini, Fátima Colin e Mônica Izidoro
. Figurino e adereços: Carlas Biolchini e Saulo Gomes
. Design gráfico: Gisele Ferreira
. Fotografia: Marco Netto
. Produção executiva: Calé Miranda e Carla Biolchini
. Assistente de produção: Saulo Gomes
. Divulgação: Lu Gastão
. Apoio institucional: FCCMM
. Realização: Cia. Da Ação!
Serviço
> O Marinheiro - De Fernando Pessoa. Com a Cia. da Ação! Teatro! Dança. Estreia nesta sexta-feira, 7, no Espaço Z, em Resende, e cumpre temporada até dia 23, de sexta a domingo, sempre às 21h. O preço promocional dos ingressos é R$ 10 e podem ser adquiridos no próprio local. Informações: (24) 8111-8432, Calé Miranda.