(Foto: Divulgação)
Única fragilidade: Algumas histórias ficam bobas e alguns personagens, frágeis
Eu fui uma das pessoas que quase caíram da cadeira ao assistir o primeiro filme da trilogia "Matrix" no cinema, em 1999. De lá pra cá, sempre tive profundo respeito pela obra dos irmãos Wachowski. E "A viagem", o mais recente filme da dupla com o diretor Tom Tykwer (mesmo de "O perfume" e "Trama internacional"), que chegou aos cinemas do Brasil na semana passada, faz jus à pesquisa filosófica dos irmãos encontrada na obra "The Matrix". Nesse novo filme, a filosofia fica diluída através das seis épocas distintas onde se passam as tramas. Sim, o filme retrata seis histórias simultaneamente, apesar de não ser um filme em que o tempo está no foco temático de seus realizadores. Isso é o caso de "Babel", do diretor Iñárritu (se você não viu esse filme, corra para as locadoras hoje), que também retrata histórias diferentes simultaneamente com maestria. No caso de "A viagem", ouso dizer que os irmãos utilizaram desse recurso temporal para recapitular as questões ideológicas presentes em seus filmes anteriores. E a condução entre as histórias é feita naturalmente, não é daqueles filmes que você tem que assistir quatro vezes pra compreender o que realmente aconteceu.
Não espere encontrar recursos narrativos complexos, ou jogadas incríveis de linguagem cinematográfica, ou mesmo um filme perfeito sem arestas. Não me parece que esse é o foco central dos realizadores. Eles colocam todos os recursos possíveis em função do desenvolvimento de suas ideias, sempre utilizando a realidade retratada de pretexto para se discutir filosofia. E o que não faltam nesse filme são recursos, tanto de ordem financeira, quanto de ordem artística. Temos um elenco de primeira e uma fotografia sublime acompanhando uma caracterização arrebatadora, o que nos permite usufruir de todas as histórias sem choques, mesmo que em uma sequência nos transportem para um drama em 1849 na época da escravatura e na sequência seguinte estejamos em 2144 em uma ficção científica revolucionária.
Roteiro frágil
O único elemento que eu sinto um pouco de fragilidade na obra é o roteiro. Devido ao grande número de situações distintas, algumas histórias ficam bobas, alguns personagens frágeis, pois não temos tempo nem vontade de se envolver com tantas emoções. Apesar disso, o eixo principal não perde força por causa da fragilidade de algumas tramas, e assim os diretores vão nos conduzindo por todas as ramificações filosóficas da obra. Sabe aquele filme que rende três horas de papo depois de assistido? Estamos falando de um desses, um filme que depende muito da bagagem e das referências que o espectador leva para o cinema, fazendo com que essa obra gere múltiplas camadas de interpretação, pessoais e intransferíveis. É um filme sobre o amor? Sobre a arte? Sobre a vida? Acho que de tudo um pouco, dependendo do espaço escolhido pelo receptor a ser preenchido.
Indico principalmente para as pessoas que adoram ver o filme além do que é mostrado na tela, que curtem pesquisar referências e se aprofundar nas obras. Se você curte isso, mas seu fiel companheiro(a) de cinema não curte, não tem problema. Indico "A viagem" mesmo assim, pois você pode passar as quase três horas de filme tentando adivinhar as complexas caracterizações dos personagens, uma vez que todos os atores do elenco principal estão presentes nas seis histórias com personagens bem distintos, às vezes com cor de pele trocada, tipo de olhos, ou mesmo o sexo. No mais, se você curte filosofia, essa é mais uma excelente obra dos irmãos Wachowski para rechear inúmeras discussões.
Quem é quem no filme
. Título original: Cloud Atlas
. Direção, roteiro e produção: Andy Wachowski, Lana Wachowski e Tom Tykwer
. Obra original: David Mitchell
. Elenco: Tom Hanks, Halle Berry, Hugh Grant, Susan Sarandon, Jim Broadbent, Hugo Weaving, Jim Sturgess, Ben Whishaw, Keith David, David Gyasi, Zhou Xun e Doona Bae
. Trilha sonora: Tom Tykwer
. Duração: 172 minutos
. Ano: 2012
. País: EUA
. Gênero: Drama
. Cor: Colorido
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