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Violência

Mais um corpo estendido no chão

Do Rio a Bahia, São Paulo a Mato Grosso; as chacinas que, Brasil a fora, maculam nossa pátria mãe gentil

Pelo Brasil  –  18/09/2012 20:50

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(Foto Ilustrativa)

A cena não é nova no Brasil. Segunda-feira, primeiras horas da manhã, seis corpos imóveis se enfileiram no chão de terra às margens da principal rodovia do país. A via que liga os dois mais importantes e ricos estados brasileiros amanhece com sinais da tortura e crueldade cometidos contra jovens amigos do subúrbio fluminense. Dois dias depois, policias militares de São Paulo assassinam outros nove jovens, qualificados como “suspeitos”, na capital paulista. Mais dois dias e outra chacina vitima três homens em Mato Grosso, próximo à divisa com a Bolívia. Uma semana antes, em João Pessoa, mais quatro homens já haviam sido mortos no episódio que ficou conhecido como “Chacina de Cruz das Armas”. O extermínio de jovens - negros e pobres, sua maioria - conecta o Brasil em uma triste estatística que produz lamento e dor em todos os cantos do país.

No Rio de Janeiro, a chacina no município de Mesquita, próxima à Favela da Chatuba, teve requintes de crueldade e métodos de tortura. Os seis jovens - que depois somaram-se a outros três homens assassinados no mesmo fim de semana - foram encontrados com marcas de tiro e alguns totalmente desfigurados. Segundo relatos, os jovens foram empalados e torturados durante todo o dia antes de serem assassinados.

A crueldade salta aos olhos

A crueldade do ato salta ainda mais aos olhos quando as investigações começam a apontar para os mandantes do crime: dois jovens, de 15 e 16 anos, confessaram a barbárie como forma de se estabelecerem enquanto autoridades na região. Na ação, foram acompanhados de mais de uma dezena de outros jovens, vinculados ao tráfico de drogas local. 

O pedreiro Ceudes Vieira do Espírito Santo, 42, era a imagem do desconsolo. Pai de um dos jovens, chorou copiosamente pela perda de seu filho. “Mataram o meu filho e jogaram o corpo dele na estrada igual a um bicho”, protestou, comovendo todo um país.

Assassinos vestiam farda em São Paulo

Já na capital paulista, os assassinos vestiam farda. “Quem não reagiu, está vivo”, defendeu o governador Geraldo Alckmin, ao justificar a ação da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar), a tropa de elite da polícia paulista, que deixou nove mortos na terça, dia 11. A versão da polícia dá conta de que todos os nove eram “suspeitos”. E é sob essa capa que se justifica uma verdadeira guerra civil travada atualmente no Brasil.

Os chamados “autos de resistência”, como são classificados os homicídios cometidos pela polícia em supostos revides a ataques criminosos, foram responsáveis pela morte de mais de 10 mil pessoas apenas no Estado do Rio nos últimos dez anos. É como se três pessoas morressem diariamente no estado em confrontos com policiais. Somadas, apenas as polícias do Rio e de São Paulo matam anualmente mais que a soma das execuções por pena de morte cometidas em todo o mundo, nos países que admitem tal prática.

Índices têm caído

É importante registrar que esses índices, sobretudo no Rio, têm caído nos últimos anos e o auto de resistência, que já rendeu gratificação no passado, hoje é prática condenada ao menos nos discursos políticos e nos manuais de Segurança Pública. Ainda assim, os dados permanecem alarmantes e agravados com o fato de que a maioria dos autos que passam por investigação, seja da imprensa ou mesmo da polícia, revelam-se como fraudulentos - são execuções sumárias registradas como se fossem práticas legítimas das forças militares.

Forças que também sofrem com a violência marginal, é preciso registrar. Em pouco menos de dois meses, já foram três os policiais assassinados por criminosos nas comunidades cariocas – em julho, a soldado Fabiana Aparecida de Souza, de 30 anos, foi atingida por uma bala de fuzil dentro da UPP do Complexo do Alemão; e recentemente, dois policiais foram mortos na Rocinha, Zona Sul carioca, e na Coroa, na região do Centro. A cidade pacificada começa a ver ameaças ao cenário idílico que projetou para seus próximos anos.

Chacinas com menos destaque midiático

Em outras regiões do Brasil, com menos destaque midiático, chacinas recentes também mexeram com a sociedade local. Na cidade matogrossense de Porto Esperidião, distante cerca de 350 quilômetros da capital Cuiabá, três homens foram assassinados dentro de uma fazenda, próxima à divisa com a Bolívia, na sexta-feira, 14. Segundo a polícia local, há suspeita do envolvimento de grileiros, pois a fazenda fica na divisa com uma área de grilagem.

João Pessoa, na Fortaleza, também viu uma chacina vitimar quatro pessoas, no início do mês. O crime ocorreu durante uma seresta realizada em um bar na Zona Oeste da capital e o principal suspeito é foragido da penitenciária local. Ainda no Nordeste, a Bahia assistiu à morte de quatro homens, há pouco mais de um mês, em uma cidade litorânea ao sul do estado.

Até mesmo Barra Mansa, na região sul fluminense, foi palco de uma chacina recente que deixou mortos três jovens da cidade. André Luiz de Souza Ribeiro, de 22 anos, Jonathan Silva, 26, e Diogo Silva e Silva, 20, foram encontrados mortos a tiros em um morro no bairro Cajueiro, na manhã do dia 20, uma sexta-feira.

Uma tentativa de resposta à cena de extermínio

Nos próximos meses, o governo federal lançará um Plano Nacional para enfrentamento da mortandade juvenil, que vai congregar uma série de projetos e ações, desde formação profissional até a repressão ao uso de drogas e à violência. Integra ministérios, secretarias nacionais e contou com atores da sociedade civil em sua elaboração.

É uma tentativa de resposta à cena de extermínio que se perpetua com a falta de políticas públicas voltadas à juventude na maioria dos municípios brasileiros. “A violência contra a juventude é uma violência contra todos nós. Estamos comprometendo uma geração com tamanhos índices de violência”, comentou recentemente a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário. “O país não pode continuar sob o marco de manuais que foram produzidos durante a ditadura militar, que viam os jovens negros e pobres como ameaça à segurança do país”, completou.

O cenário continua irremediavelmente velho no Brasil.

Por Jader Moraes  –  jader_jc@yahoo.com.br

1 Comentário

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  • Pedro

    Chocante, sao muitas mortes, pouco ouvimos falar disto.