
(Fotos: Divulgação)
"Bordel do Rock" foi fundado em meados de 2009
por um grande colecionador e dinossauro do rock
A "Série Loucos por Música", fazendo história na internet, apresenta no dia de Natal um bordel do rock! Um bordel repleto de discos interessantes postados por gente bacana e que acredita em cultura e entretenimento de qualidade. Os meninos debocham nos codinomes, mas falam sério nas postagens. Meu convidado de hoje é o Micose, 20 e poucos anos, estudante de design. Colaborador no "Bordel do Rock" desde 2010, fundado pela ilustre Putavéia, a meretriz do rock.
Márcia: Como e quando começou a escrever seu blog? Qual era o objetivo e esse objetivo permanece o mesmo ainda hoje?
Micose: O nosso querido "Bordel do Rock" foi fundado em meados de 2009 pela ilustre Putavéia, um grande colecionador e dinossauro do rock que tive o imenso prazer e a oportunidade de conhecer pessoalmente. Como o foco do blog é o rock setentista, então a gente sempre busca o que há de melhor daquela época, mas também sem limitar somente a ela e postando outras coisas mais novas. É também uma forma de revolta contra vários colecionadores egoístas, boçais e que se acham os donos das bandas - especialmente os de bootlegs - que pleiteiam pra que várias raridades nunca sejam compartilhadas. Eu, que já era frequentador, entrei pro time do Bordel do Rock em 2010 e desde então sigo firme e forte.
Márcia: Quando começou já era “Bordel do Rock” e por que escolheu esse nome?
Micose: Sim, sempre foi "Bordel do Rock" desde o início. Como o próprio fundador se intitula "Putavéia", então nada melhor do que chamar o blog de Bordel mesmo. Como temos vários visitantes estrangeiros, acredito que o nome não seja tão complexo pra maioria deles.
Márcia: Como escolhe os álbuns para postagem? Suas escolhas são aleatórias?
Micose: Pelo menos da minha parte, as escolhas são mais ou menos ou completamente aleatórias de fato. De repente eu me lembro ou eu acho alguma coisa que eu considere legal pra postar, independente do país, estilo ou seja lá o que for, eu vou e posto. Nunca planejo o que eu vou postar na próxima semana ou mês, só posto mesmo o que me bate na telha.
Márcia: Já teve algum tipo de problema com gravadoras ou bandas ou teve álbuns deletados de provedores?
Micose: Eu lembro da Putavéia ter recebido ameaças umas duas vezes, não lembro de qual órgão foi, mas sei que na última ele preferiu que a gente se mudasse pro Wordpress, que pra nossa surpresa foi até pior, porque eles são de longe muito mais rígidos do que o Blogspot e deletaram o blog sem ao menos nos notificar previamente. Por sorte, o do Blogspot permaneceu intacto e ainda recebendo visitas e os links dos nossos álbuns, na época hospedados no Multiupload, também continuaram ativos. Em relação aos provedores de arquivos, atire a primeira pedra o blog que nunca teve álbuns deletados! Antigamente nós usávamos o Megaupload e Rapidshare numa boa época, só que aí fecharam o Megaupload, o Rapidshare ficou uma porcaria e passamos a usar o Multiupload, que hoje em dia é uma porcaria, e agora voltamos pro Rapidshare, que ficou bom de novo! Antigamente eu "tomava emprestado" links de outros sites, mas hoje em dia eu mesmo faço o upload dos arquivos.
Márcia: Você acredita que de alguma forma esteja prejudicando alguém com suas postagens, falando de direitos autorais?
Micose: Pelo contrário, porque o que a gente faz mais do que tudo é propaganda pra essas bandas e completamente de graça. Graças à internet, as bandas mais antigas e menos conhecidas ganham um novo público e têm seu trabalho mais difundido e valorizado como deveria ter sido décadas atrás, sendo assim há demanda pra que muitas delas voltem a fazer shows ou até mesmo a criar coisas novas. É por isso que os vinis voltaram a ser bastante procurados, porque o público tem cada vez mais aumentado e se reciclado. Em relação às bandas mais jovens, isso não deixa de ser uma oportunidade pra difundir novos talentos e novas ideias, agora se as grandes gravadoras se sentem prejudicadas é porque elas não souberam e ainda não aprenderam a se adaptar aos novos tempos e assim continuarão cada vez mais arcando com as consequências disso.
Márcia: Qual é a importância de um blog dedicado à musica?
Micose: No nosso caso, como se trata de um blog que tem como objetivo disponibilizar álbuns de bandas de rock, não deixa de ser um espaço pra gente difundir um pouco do que a gente curte, é algo que a gente faz por prazer e que se sente bem em compartilhar um pouco do que a gente gosta. Como geralmente no nosso cotidiano é difícil conhecer pessoas que curtam as mesmas coisas que a gente, então o blog é mais um meio de atrair essas pessoas que também se sentem isoladas. Felizmente conseguimos visitantes quase que do mundo inteiro e temos até alguns membros da equipe que são estrangeiros.
Márcia: A maioria dos internautas não deixa comentários de agradecimento, mas quando querem reclamar ou pedir sabem usar os comentários, isso te irrita?
Micose: No início eu nem ligava, mas com o passar do tempo, com todo empenho no blog pra sempre trazer algo legal, isso acaba sendo chato. Muitas vezes em um post não há nenhum comentário, mas alguns provedores permitem que você veja quantas pessoas baixaram aquele arquivo e de repente se dá conta de que ele foi baixado umas 100 ou 200 vezes num único dia... e nenhum "obrigado" sequer foi dado! Ou então acontece de um post só ter nos comentários pedidos de repostagem! Não que eu deixe de continuar postando por causa disso, mas também não me sinto na obrigação de ficar repostando coisas pra um bando de chorões. Quando já é alguém que agradece com uma certa frequência, aí a coisa muda e eu republico numa boa. Também publico numa boa qualquer coisa que alguém me sugerir e que eu ainda não conheça ou não tenha postado.
Foco do blog é o rock setentista, sempre postando o que há de melhor daquela época
Márcia: Faz ideia de quantos álbuns já publicou no blog?
Micose: Acabamos de atingir a marca dos 800 posts, mas de álbuns mesmo não deve ser muito menos que isso, somando o que todos os membros postaram e, é claro, tirando o que a gente postou no Wordpress.
Márcia: Acredita que haja competição entre certos blogs?
Micose: Competição entre blogs é basbaquice, acho que todos eles devem se somar, até porque ninguém conhece tudo e muito menos consegue postar tudo. Há sempre alguém aí com algo legal que você não conhece, então pra quê perder tempo com birras se você pode conhecer várias outras coisas e ainda fazer vários amigos que gostam das mesmas bandas que você?
Márcia: Quando começou a colecionar?
Micose: Até os 15 anos, tudo que eu tinha eram alguns poucos CDs e álbuns em mp3. Minha visão musical mudou radicalmente quando eu conheci o Kraftwerk, a partir daí eu comprei vários CDs deles e até ganhei dois vinis inteiraços de uma tia, além de também começar a caçar os bootlegs deles. Passei bem uns dois anos fritando meu cérebro só nessa banda, passei a ser xiita de Kraftwerk mesmo. Depois eu fui apresentado ao universo encantado do rock progressivo, que me abriu novos horizontes e através do Kraftwerk eu conheci o krautrock, que é um dos meus subgêneros favoritos. Mas não virei xiita de progressivo, apesar de ser o estilo que eu mais ouço.
Márcia: Sua coleção aconteceu por acaso ou desde o início você já sabia que era um colecionador?
Micose: Acho que o primeiro passo foi criar uma visão diferenciada da música, no que se refere de ter um carinho especial e tratar cada álbum como se fosse uma obra que exija um tempo pra ser apreciada e degustada, ao invés de tratar como se fosse algo descartável. Depois do Kraftwerk, eu com certeza passei a ouvir música de uma maneira totalmente diferente que antes e assim ingressei nessa busca incansável e insaciável por bandas que eu jamais teria contato se a internet não existisse.
Márcia: Sua coleção é de LPs, CDs, mp3 ou tudo junto?
Micose: Coleciono CDs e LPs à medida em que meu orçamento me permite, mas sempre busco priorizar vinis e se possível de bandas mais raras, não só por uma questão de fetichismo, por possuir algo meramente difícil de encontrar e que poucas pessoas conhecem, mas por ser também um investimento. Como os vinis agora viraram moda cult, nada melhor do que possuir uma relíquia em mãos, o que lhe permite a possibilidade de outras negociações com outros colecionadores. Em relação aos CDs, acho preferível comprar aqueles que nunca saíram ou que nunca sairão em vinil e com encartes monstruosos. Os CDs da Garden of Delights, um selo alemão independente, são um grande exemplo disso, que além de lançarem gravações raríssimas de bandas geralmente de krautrock ainda incluem encartes monstruosos com os detalhes mais sórdidos possíveis de cada banda. Quanto ao que eu baixo, eu geralmente evito ao máximo mp3 e dou prioridade extrema a álbuns em formato "lossless" (flac, ape, wv, shn, wav), tanto é que no "Bordel do Rock" não há nada disponível em mp3, mas por outro lado haja HD pra sustentar esse vício!
Márcia: Sua coleção é só de rock ou outros gêneros podem entrar?
Micose: Como eu já disse, eu tenho uma tara especial por rock progressivo, especialmente quando se trata de bandas alemãs e de krautrock. Às vezes a gente mergulha tanto em um estilo tão específico como o krautrock, por exemplo, que a depender da quantidade de bandas ou de álbuns, a gente passa só a ouvir aquilo durante um tempão, mesmo que por acidente. Fora do universo do rock, acho que o eu ouço é algumas coisas de jazz, outro universo imenso, e outras de música eletrônica, ambiente na pegada do Tangerine Dream.
Márcia: Qual o LP/CD ou mp3 que considera o mais raro de sua coleção?
Micose: Até agora, o vinil mais raro que eu consegui é uma reprensagem do selo alemão Ohr, de 1971, do Alpha Centauri do Tangerine Dream, em perfeitas condições. Dei muita sorte por achá-lo a um preço ótimo.
Márcia: E qual deles seria o mais estranho dentro da coleção?
Micose: Certamente uns álbuns de Stockhausen. Aquele velhinho era completamente pirado! Se eu fosse menos medroso, eu me arriscaria a ouvir mais coisas dele.
Márcia: Qual álbum deu mais trabalho para encontrar?
Micose: Não diria um álbum, mas um bootleg do Kraftwerk gravado em Milão, em 1991, com qualidade perfeita. Um dos melhores bootlegs que eu já ouvi deles e que infelizmente só se acha geralmente bem incompleto. Eu consegui a versão completa com um cara que é amigo do autor da gravação. Levei bem uns dois anos pra encontrar essa raridade, mas pelo menos compensou a procura.
Márcia: Ainda tem uma lista grande de discos que procura?
Micose: Não tenho uma lista, mas quando eu vou em algum sebo ou feira sempre vou procurando o máximo que posso pra ver se bato o olho em algo que eu me lembre que eu esteja interessado.
Márcia: Como costuma achar seus objetos de desejo?
Micose: Quando não são nas feiras e sebos, eu recorro à Amazon britânica, mas como a matriz tá começando a se ceder aos esquemas de taxação do governo brasileiro, o jeito é recorrer a sites de lojas menores ou até mesmo de selos independentes que vendem diretamente do estoque deles. E pra baixar, ninguém supera o RuTracker, com seu acervo incomparável, apesar de eu consultar também o AvaxHome e o LosslessGalaxy, mas pros bootlegs, tem o Dimeadozen, que é o torrent tracker mais popular e é exclusivamente pra isso.
Márcia: Sua coleção é compartilhada no seu blog?
Micose: Nem tudo que eu baixo é compartilhado. Eu prefiro postar álbuns mais raros, mais difíceis de serem encontrados, que em minha opinião é o que dá uma sensação de exclusividade ao blog. Por incrível que pareça, tudo que a Putavéia posta vem dos CDs originais dele, inclusive alguns deles eu não consigo encontrar em nenhum outro lugar. Acredito que ele deva ter uns 10.000 CDs ou até mais do que isso, fora os vinis, mas nem 5% disso tudo ele conseguiu postar. Quanto a mim, quase tudo que eu posto vem dos sites que eu mencionei.
Márcia: Pode citar algumas das raridades que tem em sua coleção?
Micose: Difícil listar o que é mais raro e o que não é, mas se tem uma banda que eu admiro bastante e que é pouco conhecida é o High Tide, sem dúvida uma das bandas britânicas mais criativas e talentosas do fim dos anos 60 e início dos anos 70. Tem também o Kaipa, que é uma excelente banda progressiva sueca dos anos 70.
Márcia: Sei que é uma sacanagem pedir uma listinha de álbuns favoritos, mas poderia fazer uma pequena lista com os dez álbuns que considera fundamentais em uma coleção. Lista comentada álbum a álbum, por favor!
Micose: Tarefa árdua, mas vamos lá!
1 • Yes - Close to the eEdge (1972) - Em minha opinião, não só é obra mais completa, mas também é o ápice de todo o movimento progressivo. Uma verdadeira obra-prima genial que deve constar na coleção de qualquer roqueiro, mesmo daqueles que não são chegados no progressivo.
2 • High Side - Sea shanties (1969) - Como já havia mencionado, o High Tide é particularmente umas das melhores bandas britânicas de progressivo. O som desses caras é completamente inconfundível, uma vez que é marcado pelo constante dueto e guitarra e violino, com níveis de distorção incomuns pra época. Parece mais um rockn roll viking. Alguns dizem que há influências de Blue Cheer e Steppenwolf, enquanto que outros dizem ser um ancestral do metal progressivo.
3 • Budgie - In for the kill! (1974) - O melhor álbum da banda que me fez prestar mais atenção em hard rock. Com sua base bluesística e moldes que seriam aproveitados por bandas do New Wave Of The British Metal, o Budgie é um power trio do País de Gales que certamente foi uma das mais criativas e mais pesadas do rock britânico setentista. O "In for the kill!" é uma tremenda cacetada e talvez o álbum deles que mais explore improvisações.
4 • Guru Guru - Känguru (1972) - É o último trabalho com a formação clássica da banda. Uma das maiores e mais consistentes obras-primas do krautrock que com apenas quatro músicas de cerca de 12 minutos cada parecem descrever a jornada do LSD no processo de colonização do cérebro de algum indivíduo. Com certeza esse fará sua caixa de som derreter.
5 • Kraftwerk - Computer world (1981) - Bom, eu sou meio suspeito pra falar de Kraftwerk, até porque eu ouvi isso até o talo, mas o "Computer world" é sem dúvida um divisor de águas na música eletrônica pop e em tantos outros subgêneros que surgiriam a partir dali. Extremamente futurista não só pelo som, mas também pelo conceito que carrega consigo.
6 • Magma - Mekanïk destruktïw kommandöh (1973) - De longe o álbum de rock mais consistente já produzido na França. Com fortes alicerces no jazz, o Magma - liderado por Christian Vander, que em minha opinião é o melhor baterista de progressivo - inventou um estilo musical pra lá de esquizofrenicamente orquestrado e sinistro chamado Zeuhl, fora o Kobaïan, que é o idioma próprio deles. Confesso que não gostei desse álbum na primeira vez que eu o ouvi, mas depois pouco a pouco eu fui descobrindo a genialidade que ele escondia. Acho que a intenção dele é assustar mesmo.
7 • Hawkwind - Space ritual (1973) - Hawkwind é uma espécie de punk dentro do progressivo, uma vez que não tinha a mesma complexidade musical em relação a outras bandas, apesar de criar uma atmosfera muito mais abissal com vários efeitos eletrônicos e distorções. Além disso, é uma banda pra definitivamente ser ouvida ao vivo, situação em que essa atmosfera fica ainda mais marcante. É de longe um dos melhores álbuns ao vivo dos anos 70.
8 • Módulo 1000 - Não fale com paredes (1970) - Considerado o primeiro álbum progressivo brasileiro, o "Não fale com paredes" é o único álbum do Módulo 1000 que acabou sendo censurado pela ditadura. Tem um som completamente distinto de tudo feito aqui na época e não deve absolutamente nada a qualquer banda inglesa. Alguns dirão que tem influência de uma cacetada de bandas, mas é pura balela. Módulo 1000 é Módulo 1000 e ponto final.
9 • Tangerine Dream - Encore (1977) - Assim como o Kraftwerk, o Tangerine Dream é pioneiro em música eletrônica, apesar de ter seguido a vertente da música ambiente. Seus álbuns de estúdio parecem mais amostras grátis em comparação aos bootlegs que existem aos montes por aí deles. Como nos primeiros anos, todos os shows do Tangerine Dream eram feitos basicamente a partir de longas sequências de improvisos, se eles quisessem, eles poderiam lançar quantos álbuns eles quisessem por ano. O "Encore" é uma coletânea de gravações durante a primeira turnê da banda nos Estados Unidos, com material que até então nunca tinha saído em outro álbum. Uma verdadeira e incansável viagem musical.
10 • Eloy - Ocean (1977) - Essa banda é uma verdadeira terapia musical! O "Ocean" - em minha opinião o melhor trabalho deles - te faz se sentir nas nuvens, livre de absolutamente tudo. Suas quatro faixas descrevem a chegada e a estadia de Poseidon, o Deus do mar, segundo a mitologia grega, em Atlantis, ilha que era de seu domínio. Um álbum totalmente relaxante e que ao mesmo tempo te deixa com vontade explorar ainda mais a profundidade musical do mesmo. É de fato um oceano musical cheio de segredos.
Caso queira acompanhar a série “Loucos por Música”, os já publicados são:
> Luciana Aum do blog ProgRockVintage
> Cristian Farias do blog Eu Escuto
> Luiz Fernando Rodrigues dos blogs Envoyez-la e Eu Escuto
> Marcello “Maddy Lee” do blog Pântano Elétrico
> Renato Menez do blog Stay Rock
> Romeu Corsino do blog Prog Resenhas
> Tiê Passos do blog Difusor de som
> Eduardo Marins do blog Planeta Progressivo
> Homem Traça do blog Criatura do Sebo
> Heldon Brazil do blog Progressivo-Vivo
> Os seis meninos do blog Valvulado