(Fotos: Divulgação)
Os discos listados nesta página não estão em ordem de importância
Na série “Discos Fundamentais”, solicitei ao meu ilustre amigo Márcio Martílio de Souza a sua listinha com dez discos que considera indispensáveis em uma coleção. Sei e reconheço que pedir para qualquer pessoa que ame música uma lista com dez títulos é uma sacanagem, mas... Segue a listinha comentada:
Top 10 dos discos fundamentais
e/ou marcantes na minha coleção
Observação: Os discos não estão em ordem de importância, portanto a lista não os distinguem como os mais e os menos relevantes!
1. Religare - “reliGare”
Não, eu não errei na digitação! O título do disco é assim mesmo! Projeto produzido por Lui Coimbra, Antonio Quintella e Marcos Magalhães, o Religare nasceu de uma ideia despretensiosamente refrescante como uma tarde de verão no Arpoador. E assim o fenômeno em que se transformou a bolacha lançada em meados de 93 me pegou pelos ouvidos!
Uma mistura de reggae, com destaque para as versões incríveis de “Positive vibration” (B.Marley) e “My sweet lord” (G.Harrison), canto gregoriano (“Agnus Dei”), rock e mantras vai te envolvendo, ora conduzindo à meditação, ao relaxamento, ora à dança cadenciada, o que no final das contas agrada a gregos e troianos, desde que ambos tenham a devida capacidade de distinguir o que os caras fizeram (apoiados por uma pá de gente, famosa ou não) do que a indústria musical realmente deseja que a gente ouça.
Tive o prazer de assistir ao último show deles, no Arpoador (durante o extinto e saudoso projeto “Som nas Ondas”) numa tarde calma de sol se pondo, gente se abraçando, cheiro de incenso no ar e aquela sensação de que todos ali se conheciam há anos! Só agora, em 2012, consegui reencontrar o álbum (em CD), que havia adquirido em vinil. Na web pouca coisa faz referência ao disco. Mas vale a pena garimpar! “Aza utama” (hoje é o dia mais feliz da minha vida)!
2. Pendragon - “The jewel”
Falar de neo-progressivo (ou neo-prog) e esquecer o Pendragon é como falar de samba e esquecer Paulinho da Viola! Estilo tido como “irmão mais novo e moderninho” do rock progressivo tradicional, o neo-prog deve muito a esses caras, assim como ao Marillion, IQ, Twelfth Night e outros tantos. Em “The jewel” percebi que minha admiração pelas melodias mesclando o complexo andamento de sua maior influência, somado ao fácil toque da música pop não era restrita a Fish & Cia. Desde a primeira faixa (dançante e animada, algo até meio surpreendente para o estilo) dá pra se gostar dos riffs, das viradas de bateria e da voz meio fraquinha (sim, eu admito) de Nick Barret,o homem por detrás da comitiva! Claro que Clive Nolan também é peça-chave no projeto de sedimentação do estilo “Pendragon” de ser, mas Barret, com seu registro vocal singular, dá ritmo e nos conduz por um caminho que nos leva intuitivamente aos álbuns que se sucederam (“The world”, “The window of life” e por aí afora). Ótima pedida para quem quer entender o que é o som do Pendragon, embora muita coisa tenha sido desenvolvida (leia-se melhorada) a partir de então.
3. Milton Nascimento - “Clube da esquina”
Milton foi a porta de entrada pra música mineira. E que porta! Esse disco, salpicado de gente fera tocando, cantando e produzindo, dá uma aula de como transportar o ouvinte para algum lugar, sem que ele tenha sequer ido até lá.
Difícil destacar alguma faixa, mas talvez a que tenha me atraído foi, sem dúvida, “Um girassol da cor do teu cabelo”. Lô Borges dá ao clássico uma sensação de autenticidade quando declama os versos dessa canção, deixando, pra ser bem sacana e plagiador, ”um gosto de sol” na gente!
E, já que citei descaradamente essa canção, devo confessar que ela fez parte de um momento muito especial em minha vida, quando transitava do luto pela perda de meu pai para a alegria e ansiedade por encontrar o meu amor, numa cidade nem tão “estrangeira” como celebra o menestrel das Minas Gerais.
Obra essencial pra quem se diz entendedor de Música Popular Brasileira!
4. Rush - “Subdivisions”
Ao contrário do que alguns amigos desavisados possam imaginar, minha relação com o som do Rush não foi um caso de amor à primeira vista. E a culpa recai exclusivamente sobre quem, a meu ver, é uma das peças fundamentais na identidade da banda.
Nos (já embaçados pelo tempo) anos 80 tudo o que eu sabia de Rush (sem saber, na verdade) era o tema da série “Profissão: perigo” (conhecida lá fora como “McGiver”), “Tom Sawyer” (do “Moving Pictures”). Ou seja, nada.
Por isso, quando ouvi “Subdivisions” (a música) pela primeira vez, fiquei entusiasmado pela tecladeira que remetia aos games da época (Atari?), à bateria com andamento totalmente diferente de tudo que eu já tinha ouvido (embora nem tivesse ouvido tanta coisa diferente assim até então) e ao riff que já se anunciava como marca registrada da banda. Mas aí veio o vocal e... Eu explico...
O baixista/tecladista/vocalista Geddy Lee sempre comenta nas entrevistas que sua voz é fonte ininterrupta de prazer aos detratores do Rush, que a usam como plataforma para desancar o som, o estilo musical, o jeito de ser e o que mais estiver visível aos olhos de quem nasceu para odiar o trio canadense. E, como ele não pode mudar sua voz, convive com isso sem maiores traumas. Eu não os culpo, pois não é fácil assimilar aquele timbre de pato sendo exposto à radiação nuclear enquanto declama letras looongas (tá bom, eu não resisti à tentação de imitar um típico crítico do Rush). Mas quando se entende que Lee, Lifeson & Peart são, juntos, a essência do Rush, e que voz, mãos e pés não apenas conduzem, mas fundem-se a seus instrumentos musicais, a gente consegue sair facilmente da reação de “que raio de voz é esta?” para “este é o Rush, inconfundível”.
“Subdivisions” teve a ingrata missão de substituir o celebradíssimo “Moving pictures” e não fez feio. Trata-se de mais um dos discos reconhecidos como divisor de uma era na carreira da banda (e só os fãs irão entender essa definição).
Algumas influências contemporâneas podem ser identificadas aqui e ali, mas “Subdivisions” é por si só um disco muito mais referencial do que tributário. Eu sempre o indico a quem se interessa pelas fases mais progressivas da banda, pois, embora não o seja, ele conduz o ouvinte, ou para longe (caso não goste da voz de Geddy Lee, dos riffs cheios de efeitos de Lifeson ou das viradas complexas e impossíveis de serem acompanhadas da bateria de Peart, por exemplo!) ou cada vez mais para dentro da discografia dos “3 patetas”... Destaques? A faixa-título (com sua introdução de sintetizadores arrasadora!) e “Chemistry”, cuja combinação letra/melodia até hoje é uma de minhas favoritas!
5. Jethro Tull - “Aqualung”
Que Ian Anderson é um gênio, até os pardais que infestam meu telhado sabem. Mas que ele é um dos maiores criadores de salmão da Europa, pouca gente tomou conhecimento. E o que isso tem a ver com “Aqualung”? Bom, se eu fosse Anderson, após esse álbum, me concentraria nos negócios de piscicultura e viveria feliz com minha obra-prima. Mas esse (para nossa alegria) não é o caso do menestrel do rock. Após lançar essa pérola musical, Anderson continuou em sua jornada, produzindo grandes (e outros nem tão grandes assim) álbuns, e dividindo suas atividades comerciais com a vida de flautista/violonista/vocalista de uma das bandas mais marcantes da história do rock.
“Aqualung” é um desafio do início ao fim. Um desafio para o ouvinte, pois é preciso estar bem atento às nuances vocais de Anderson, aos belos arranjos de Martin Barre e a tudo o que envolve a produção desse álbum de 1971.
Um desafio à mídia da época, pois músicas longas sempre foram o calcanhar de Aquiles das rádios em todo o mundo, e se gostam de J.T. tem de aturar as traquinagens de mr. Anderson.
A crítica social e religiosa contida em “Aqualung” pode ter ficado meio fora de época, mas o trabalho musical lapidado ali jamais será esquecido. E eu aprendi nesse disco que não importa se o resultado ficará tão complexo que o ouvinte terá de estudar mais para poder gostar. O importante é não se render ao apelo fácil. E isso, mr. Anderson, o senhor parece nunca aceitar. Nem por um punhado de salmões bem temperados.
6. Marco Antonio Araújo - “Influências”
Não dá pra dizer muito sobre esse disco. Apenas que é instrumental, que é fantástico e que nem parece ter sido produzido aqui no Brasil, de tão bem trabalhado.
Marco Antonio faz parte de uma pequena categoria de tocadores de cordas que viveram pouco, mas deixaram um legado atemporal.
“Influências” já se definem pelo título. E nos dá a devida noção do que levou o violonista e arranjador a criar tanto em tão pouco tempo, com tanta qualidade.
Não dá pra destacar nada. O disco é um aglomerado de sentimentos catalisados em acordes, solos, riffs... Uma viagem pela cabeça de M.A.A.
7. Rainbow - “Rising”
O Rainbow é, injustamente, catalogado por muitos como integrante do chamado segundo escalão do hard rock (existe isso?). Mas para mim tem lugar cativo no panteão dos grandes nomes do estilo, ao lado de Led, Purple, Sabbath etc.
Cria da cabeça do esquisitão guitarrista Ritchie Blackmore, o Rainbow foi a maneira com que o cara conseguiu mostrar que, longe do Purple por conta de desavenças históricas com seu “melhor inimigo” Ian Gillan, poderia não somente sobreviver, mas voltar ao topo, com uma banda que não lembrava muito o que havia feito com seus ex-companheiros.
Pra começar, Blackmore, espertamente jogou a rede sobre o ELF, grupo do qual faziam parte seus futuros colegas de banda. Do primeiro para o segundo álbum, o figuraça já mudou tudo, demitindo a maioria da galera e deixando Ronnie James Dio, que já mostrava a sua capacidade de dividir cada centímetro de palco com quem quer que fosse seu parceiro de banda. O baixinho fez então aquela que pra mim foi sua melhor performance de estúdio, justamente em “Rising”.
Álbum fundamental para os amantes do hard & heavy rock, “Rising” traz a melhor formação do Rainbow, unindo egos que, em tese, jamais poderiam estar batendo ombros em um mesmo lugar (ao menos assim eu aprendi nas aulas de física).
“Stargazer” é uma aula de peso, grandiosidade e megalomania (no melhor sentido da palavra), pois ali todos se entregam a esmerilhar seus instrumentos (com um especial destaque para o saudoso Cozzy Powel, que criou aquela introdução incomum para uma faixa tão pesada), enquanto o baixinho Dio dá a impressão de “crescer nas tamancas”, proferindo cada verso com a teatralidade que lhe fez conhecido mundo afora.
Se você tem este CD em sua coleção, coloque-o pra ouvir agora. Se não tem, corra até a loja mais próxima e pressione seu vendedor favorito até o cretino lhe vender um exemplar! Mas depois não se esqueça de lhe pedir desculpas sinceras...
8. Angra - “Holy land”
Esse é o melhor álbum de Heavy Metal nacional de todos os tempos. Do início ao fim um belo exemplo de miscigenação musical, calando a boca de quem achava que música popular não podia se misturar a rock, especialmente ao metal (e o Sepultura já havia mostrado isso, mas as críticas ainda eram insistentes).
E não dá pra explicar muito. Os caras simplesmente estavam no auge da harmonia de grupo, André Matos provava que, depois do Viper, ele ainda tinha muita garrafa vazia pra vender e o país podia explicar ao mundo que, além dos urros do Sepultura e dos Ratos de Porão, a gente sabia fazer metal melódico, sim senhor! Mas com tempero brasileiro!
9. Genesis - “Nursery crime”
“Rock progressivo? O que é isso?” Minhas dúvidas (e é que ainda existiam) se dissiparam quando ouvi pela primeira vez esse disco.
O Genesis que eu conhecia até então era o da fase Phil Collins no vocal, cheio de alegria, dançante, pop e tal... Aí...
Vejo um vídeo de “Musical box” e fico intrigado. Pego o disco e meu cérebro toma uma bordoada! Um mundo musical diferente se abriu e descobri que não era preciso ser tão simples melodicamente para ser “rock”. Erudição e humor também podiam dividir espaço com teatro, crítica política e social, com romances...
Quando dei por mim, já estava juntando trocados pra comprar mais e mais discos da fase Gabriel. Mal sabia no que estava me metendo. Era um caso incurável de vício.
Tornei-me viciado em rock progressivo. Tornei-me intoleravelmente crítico contra música ruim. E descobri que o Phil Collins era um fanfarrão... Mas um excelente baterista!
10. Kansas - “Masque”
Não é o melhor disco do Kansas. Talvez nem um dos mais conhecidos. Mas é o meu favorito, por dois motivos: a capa e a faixa “All the world”.
A capa é a reprodução de uma obra do mestre Giuseppe Arcimboldo, que, entre outras coisas, notabilizou-se por pintar figuras humanas com a combinação de animais, frutas, legumes etc. Sem o trabalho do Kansas eu não saberia da existência desse gênio italiano!
“All the world” é uma balada com forte pegada hard que me fez gostar mais ainda dos caipiras de Topeka. As mudanças de ritmo que ocorrem no transcorrer da música dão uma mostra do quão meticuloso deveria ser um dia de ensaios da banda. A busca pela perfeição na criação de cada faixa desse álbum deve ter sido exaustiva. Mas os caras fizeram um excelente trabalho, calcado em temáticas religiosas, amor etc. Disco que dá pra curtir dirigindo em uma viagem sem medo de errar o mapa. Até porque hoje em dia temos GPS...