
(Foto Ilustrativa)
As curtas mensagens do WhatsApp são as preferidas, porque as longas ensinam o que a vida é e não o que parece ser
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Qual deveria ser o tamanho das coisas do mundo? Nas medidas curtas, um padrão microscópico. Podemos compor músicas que nos aproximem do infinito, mas nunca chegaremos nele, pois ninguém alcança o infinito. Na música, se baníssemos o longo, as sinfonias seriam proibidas. São quilométricas demais, por isso, são quilometricamente belas. Beethoven e todos os outros que compuseram as extensas sinfonias não foram aprovados pela mídia que procura o rápido e o consumismo relâmpago. Os relâmpagos são lindos, são a força de Zeus, sua verdadeira face, aquela que torrou, queimou Sêmele, a mãe de Dioniso. A música erudita está sempre afastada das mídias relâmpagos. A moda é como um interruptor: um liga e desliga. Qual seria o tamanho ideal?
Quanto mais curto melhor! Só assim podemos passar logo para um outro evento. É muito chato estagnar-se. Principalmente, se nos envolvemos com o saber e o desenvolver do intelecto. Esse é o tema mais perigoso, pois quando se envolve se ama, quando se ama, se ama ao longo, quando se ama se aquece, quando alguém se aquece, não larga quem o aqueceu. Contudo, quando se ama o grande amor, tudo se acaba, se chora porque foi um longo afeto de infinitas lembranças. As grandes sinfonias nos levam ao delírio, esse é o verdadeiro amor. Só amamos o gigantesco, o maior, quando se tem apetite. As barrigas do curto estão magras, a ração midiática é pequena - não supre o que um cérebro sadio precisa para existir.
Não temos tempo
Assistir a filmes longos nem pensar! Para isso possuímos o curta-metragem de 5 minutos. São tantos vídeos para assistir! Não temos tempo. O tempo é apenas um flash. Quanto mais curto melhor. Romances? Só para pessoas especiais, os que têm tempo, são os que saboreiam as descrições minuciosas do “Grande Sertão: Veredas”. Quase quinhentas páginas são um delicioso martírio para uma alma que quer se elevar às alturas. É tão belo, mas é tão grande. Preciso é ler um pequeno poema. Mesmo assim se torna longo. Vamos, então, ouvir um “jingle”. A propaganda de massa roubou os ouvidos delicados, atraiu a atenção oferecendo um pequeno doce barato, bem açucarado.
As curtas mensagens do WhatsApp são as preferidas, porque as longas ensinam o que a vida é e não o que parece ser. A rapidez e o caminho mais curto é o do maior desespero, o da depressão, da ansiedade. Alguns estão contentes numa banheira. O mar está esquecido, pois é longo. Quero ouvir apenas música com dois acordes, a harmonia profunda embaralha meu entendimento. Adeus jazz, adeus mar, adeus sinfonia, adeus romance. O homem se transformou num “fast-time”, quer se transformar em Zeus, o mais poderoso, com seu raio, num transiente em milissegundos, o que despreza os mortais, porque tem poder. Se esse artigo fosse postado no facebook certamente seria pouco lido. Cuidado com os longos artigos, eles farão o homem pensar, e aí se corre o grande, extenso, largo, imenso perigo.
Melhor que fosse assim, na mudez! John Cage acertou em cheio. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça! “Nonada”! assim começa o romance de João Guimarães Rosa.