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Literatura & Cia.

Jean Carlos Gomes

poearteditora@gmail.com

Mona Lisa de Copacabana

Olga Savary, a maior poeta viva!

Poeta, contista, romancista, jornalista, tradutora, crítica e ensaísta, antologista, conferencista, de espírito renascentista, é homenageada pela PoeArt

Colunistas  –  24/08/2013 16:02

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(Fotos: Divulgação) 

"IV coletânea século XXI em homenagem a Olga Savary pelos seus 80 anos de vida" é o resultado da IV Seletiva Nacional de Poesia 2013 com 48 poetas;  edição ficou pronta em julho deste ano

Vicente Melo 

Olga Savary nasceu em Belém do Pará, em 21 de maio de 1933. Residiu em sua cidade natal até os 3 anos. Em 1936 sua família mudou-se para Fortaleza e em 1943, para o Rio de Janeiro, onde mora até hoje. De uma família de escritores, tradutores e jornalistas, entre os quais: Aníbal Machado, Maria Clara Machado e vários outros do clã Machado, o maestro Marlos Nobre, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes, Cícero e Lourival Nobre de Almeida, o poeta mineiro Augusto de Lima, Sílvio Meira e todo o clã Meira, do Pará (Sílvio foi o primeiro tradutor do Fausto, de Goethe, e de vários poetas alemães), Virgínio Santa Rosa, entre outros. Interessou-se desde cedo pela literatura e particularmente pela poesia: aos 9 anos já ensaiava seus primeiros poemas. 

Com o aval do professor, crítico e ensaísta paraense Benedito Nunes, seu professor de filosofia no Colégio Moderno, em Belém do Pará, a poeta, como prefere ser chamada, jornalista, contista, romancista, crítica, tradutora, antologista, conferencista e ensaísta, possui uma vasta obra literária: vinte e cinco livros publicados, de poesia, conto, crítica e ensaio, além de centenas de antologias nacionais, um livro de jornalismo literário, entre outros. Organizou três antologias de poesia e participou de inúmeros outros livros coletivos de poesia e contos, no Brasil e no exterior, ultrapassando mil títulos. Jorge Amado, Antonio Houaiss, Gilberto Freyre e vários outros escritores afirmaram jamais terem visto tal capacidade de trabalho. Para eles, Savary - como a chamavam - trabalhava mais do que 20 escritores juntos. 

Traduziu mais de 50 obras do espanhol, inglês, francês e japonês, tanto de clássicos como Pablo Neruda e Octavio Paz, como novelas, peças de teatro, memórias, contos e até textos técnicos pela Fundação Getúlio Vargas (de arquitetura e urbanismo). É a maior tradutora de Neruda, Octavio Paz, Bashô e dos clássicos japoneses do haicai no Brasil, entre outros, o que lhe valeu o Prêmio Odorico Mendes de Tradução da ABL (Academia Brasileira de Letras). 

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Olga Savary recebeu inúmeras distinções nacionais e internacionais pela sua obra. No Brasil conta mais de 40 dos principais prêmios da literatura nacional, entre eles, três vezes o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, seis da ABL, dois da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), da UBE-SP (União Brasileira dos Escritores), 15 da UBE-RJ, um da Academia de Letras da Bahia, o Prêmio Internacional de Poesia Brasil/América Hispânica e a indicação ao Prêmio Machado de Assis para o conjunto de sua obra em 1997. 

Seus poemas foram utilizados como material de palestras e cursos de literatura pelos professores Gilberto Mendonça Teles (PUC/RJ), Angélica Soares e Dalma Nascimento (UFRJ), Lucila Nogueira (UFPE), Marleine Paula Marcondes e Ferreira de Toledo (USP); psicanálise (Wilson de Lyra Chebabi); e astrologia (Martha Pires Ferreira), entre outros, no Brasil. E nos EUA, Europa e Ásia por professores brasileiros radicados e brasilianistas. Mais de 40 compositores da música erudita e da MPB musicaram seus poemas em shows, em teatros do Rio de Janeiro e São Paulo, em CDs e DVDs, como o maestro e compositor Guerra Peixe, Guilherme Bauer, Ricardo Tacuchian, na área erudita. Na MPB, Madan, cantor, compositor e violonista. 

Em 2005, baseada na obra poética reunida de Olga, a professora italiana Maria Longobardi apresenta a "Tese de Doutorado Olga Savary: Repertório Selvagem", orientada pelo professor de Roma, Giovanni Ricciardi, na Facultà di Lingue e Letterature Estraniere da Università degli Studi di Napoli “Lorientale”, em Nápoles, Itália. 

É integrante do PEN Club, associação mundial de escritores, vinculada à Unesco, da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e do Instituto Brasileiro de Cultura Hispânica. Foi a única mulher presidente do Sindicato de Escritores do Estado do Rio de Janeiro em 1997-1998. É também conhecida por ter sido a primeira mulher brasileira a lançar um livro inteiramente dedicado a poemas eróticos e a organizar "Carne viva: 1ª antologia de poesia erótica". Pioneira também em escrever haicais no Brasil, menina ainda, em 1943. Colabora com vários jornais, editoras e revistas do Brasil e do exterior, como integrante e consultora. 

Perseverante em seus trabalhos e atenta aos inúmeros projetos que desenvolve simultaneamente, dedica todo o seu tempo a fazer prefácios, críticas, traduções (remunerados) e, quando do nosso encontro em seu apartamento em Copacabana-RJ, no domingo chuvoso de 14 de abril de 2013, às14h30, ocupava-se da sua participação na XVII Feira Pan-Amazônica do Livro, que aconteceria de 26 de abril a 5 de maio de 2013, em Belém, sua terra natal. Olga Savary esteve em Volta Redonda há alguns anos, a convite da artista plástica Lydia de Jesus, para uma exposição e, como relatou, foi muito bem recebida pela amiga na Cidade do Aço. 

Conselho editorial: a poesia é essencial 

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Olga Savary é uma pessoa bem resolvida e firme em seus propósitos. Zela por sua sanidade, consciência e lucidez manifestando com frequência a saudável ousadia reparadora das sandices e demais inconveniências de ordem pessoal, social, política ou qualquer outra. Fala de sua obra com visível e mais que justificado orgulho, uma vez que, com a consagração no Brasil e disseminação por todos os continentes, alcançou uma singular posição no universo literário. 

A severidade é lastreada nos muitos descaminhos das relações profissionais, uma vez que o artista é sempre muito exigido e quase nunca valorizado e remunerado à altura, como se o universo artístico prescindisse do dinheiro. Porém, nada disso interfere em suas amizades, relações amistosas e profissionais, quando se disponibiliza interessada e carinhosa tanto para falar de sua carreira, da sua obra, como da atualidade e dos novos poetas, que contam com a sua experiência e condescendência crítica. Não gosta de olhar somente o próprio umbigo, como diz, por isso faz antologias que dão evidência aos escritores mais jovens, que a chamam de "madrinha" e "mãe literária". 

Entre as suas muitas atribuições, inclusive quase mil páginas de tradução a serem feitas, sobre a mesa de trabalho, Olga abriu um espaço exclusivo para a PoeArt Editora de Volta Redonda e aproveitou para transformá-lo em agradável momento de descontração. Mostrou boa parte de seus livros, contou histórias das amizades com os maiores nomes da literatura, comentou sobre os tantos prêmios que já recebeu e mostrou o seu admirável acervo, incluindo as obras dos pintores que a retrataram: Carlos Scliar, Farnese de Andrade, Ernesto Lacerda, João Henrique Curzio Alemand, até o pintor Tadashi Kaminagai (nascido no Japão, em Hiroshima, que viveu anos no Brasil, no Rio de Janeiro e em Belém do Pará). Olenka ou Savary - como a chamavam Drummond, Houaiss, Jorge Amado e tantos outros amigos escritores - é chamada por esses e pelos pintores que a retrataram de "a Mona Lisa de Belém do Pará" e "a Mona Lisa de Copacabana". A atriz Isabella Cerqueira, nossa eterna Capitu no cinema, prepara espetáculo teatral com a poética de Savary, utilizando este título: "A Mona Lisa de Copacabana". 

Como explicar o êxito desta obra singular e plural? Ela afirma que o conhecimento de sua obra no Brasil e no exterior lhe veio através da paixão pelo trabalho. Assim é que, além dos mais de 1.000 livros já publicados, ela tem a publicar mais 12 livros inéditos, no prelo e a sair. Ela brinca, dizendo: "É o devagar e sempre". 

Perguntamos por que não está na Academia Brasileira de Letras, já que tem uma obra vastíssima, que vai da letra A à letra Z do alfabeto, e que raros, raríssimos têm tanto a mostrar. Ela responde que por trabalhar tanto e por modéstia, nunca pensou nisto. Desde o final da década de 1970 e início de 1980, mais precisamente em 1982, já então com cinco livros publicados, só dos pessoais, sempre bancada pelas editoras (jamais pagou por suas edições), recebeu muitas sugestões e até convites dos acadêmicos amigos Antonio Houaiss, Francisco de Assis Barbosa, Jorge Amado, e entre outros, para estar na ABL. Se ouvisse, talvez já estivesse lá. Altiva, queria obra consolidada de no mínimo dez livros publicados, o que ocorreu em 1998, quando a Biblioteca Nacional juntou com a MultiMais, editora carioca, e com o apoio da Universidade de Mogi das Cruzes, de São Paulo, publicaram a sua obra reunida, sob o título de "Repertório selvagem". "Sempre fui exacerbadamente exigente comigo mesma e perfeccionista". Savary se candidatou uma única vez, confiando na grande obra que já realizara, porém não cumprindo o ritual exigido pela ABL, logo ela, que é apaixonada por rituais. No primeiro escrutínio obteve 14 votos. Mas nos restantes, os votos diminuíram, porque ela não fez as visitas obrigatórias aos acadêmicos, condição essencial. Depois, ela não teve tempo de se candidatar novamente. A professora-doutora Marleine Paula Marcondes e Ferreira de Toledo, professora da USP e estudiosa da obra de Savary, tendo já publicado dois livros sobre sua vida e obra (um em 1999, Lisboa - Portugal, pela Universidade de Coimbra com a Editora Colibrí e o segundo em São Paulo, pela Editora Ateliê, em 2009), prepara agora o terceiro livro, afirmando que com a obra já realizada ela mais do que merece entrar para a ABL. "Se eu entrasse", afirma, "teria a ambicionada família literária que admiro". Sobre tradução, diz que só poeta tem capacidade para traduzir poesia, ninguém mais. Nem ficcionista, por melhor que seja. 

Impressões contemporâneas

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O que diria hoje a poeta com tal reputação, após ter construído uma bem sucedida carreira como escritora, com a experiência de quem está às vésperas de completar 80 anos e já respondeu a todo tipo de pergunta, tanto no Brasil como no exterior? Olga é desconcertante. Para ela, famoso é o Pelé. A cultura como expressão de desenvolvimento ainda carece de conquistar o seu espaço. Reconhece que há esforços honestos nesse sentido, assim como a grande dificuldade de vencer os obstáculos da desatenção com o que realmente importa. 

Já disse que a poesia e a filosofia andam de mãos dadas a descortinar as novas paisagens da vida e considera ainda maior a necessidade da poesia hoje, como antídoto a esse modo de vida que se impõe como um sacrifício, como risco, como insegurança física e psicológica. Por outro lado, critica as muitas letras das músicas feitas para consumo, que ridicularizam e desclassificam a mulher, os costumes. "Isso é um horror, uma indignidade, uma falta de consciência crítica, uma barbárie!" 

Não há uma receita para o correto desenvolvimento, mas o país deveria cumprir com zelo a educação e a cultura, incluindo o esporte, como premissas essenciais para sanear o caminho do desenvolvimento. Segundo Olga, nunca há recursos suficientes para a cultura, por isso o governo é obrigado a gastar dinheiro nas indesejáveis consequências dessa falta de visão. Assim vive às voltas com o transporte público, a limpeza urbana, a saúde, a educação, a insegurança e outras áreas que mais se degradam com o passar do tempo. 

Para os novos poetas deixa um recado fundamentado em sua experiência: "Tenham paixão, dediquem-se, sejam persistentes, para alcançar a maturidade. Sejam exigentes com a qualidade de seus trabalhos. A poesia é essencial na vida das pessoas, mas a sobrevivência do escritor exige o desenvolvimento de múltiplas habilidades. Sempre privilegiei a poesia. Tenho um romance escrito há 25 anos e ainda não publiquei. Por quê? Por conta da exigência extrema com o que escrevo". Há anos Paraíso recebeu o Prêmio para Romance Inédito da UBE-RJ, na ABL. 

Com tantas e tão múltiplas atividades na literatura, sempre foi considerada uma poeta, contista, romancista, jornalista, tradutora, crítica e ensaísta, antologista, conferencista, de espírito renascentista. Quem desempenha com tal profissionalismo e tal vigor de obra o que Savary construiu ao longo de 70 anos de literatura, ela que iniciou muito cedo sua trajetória poética e literária? Raros, raríssimos. 

Por ser de uma região tão rica e original em criatividade, como a sua região amazônica, Olga sabe o valor da palavra - como afirmou Jorge Amado, prefaciando-a, que "ela sabe tudo da poesia e do mar, de um saber completo. Aqui está inteira em seu livro, em seu búzio, Olga Savary". 

Sua terra, mais que amada, Belém do Grão-Pará, ensina a Olga que as coisas todas da vida têm cor, som e sabor, mais a palavra com nobre peso. A palavra possui fantasia, imaginação, sortilégio, magia, criatividade, dependendo de quem a usa. 

Olga possui uma "marca própria", como dizia Drummond, em 1955. Que ela tem "carisma" já afirmava Jorge Amado, Antonio Houaiss, Gilberto Freyre, Antonio Carlos Villaça, Cassiano Nunes (professor da UnB) entre tantos outros. Carisma, este algo mais entre artistas, foi o que mostrou a professores e alunos nas várias conferências que realizou ao longo da vida em escolas, universidades, congressos, seminários, simpósios, para os quais sempre foi convidada com tudo pago e mais o cachê, ou seja, profissionalmente. 

Grandes dores físicas e morais lhe ensinaram a serenidade que sempre teve e principalmente a que a acompanha hoje. É segura, centrada, tentando fazer o bem para si e para o seu semelhante. Agora em 2013, quando completa seus redondos 80 anos, está sendo homenageada por amigos e pelos principais grupos de poesia do Rio de Janeiro como APPERJ, Poesia Simplesmente, Poesia Viva/UAPÊ, Poeta Saia da Gaveta, todos declamando seus poemas.

Convidada à Feira Pan-Amazônica do Livro, em Belém do Pará, sua terra de nascimento (sendo de raiz pernambucana, de Recife), fez conferências para adultos, também para alunos e professores de várias escolas da rede pública, lendo seus poemas. Ao final, a garotada entre 10 e 17 anos mais os professores, cerca de 100 pessoas, subiram ao palco fazendo declarações de amor à escritora: "eu te amo", "te adoro", "estou em êxtase", "és apaixonante", acontecimento já ocorrido no Rio, São Paulo e outros lugares. Tudo isto a comoveu, justo por ser em sua terra, e também porque, ao longo da vida, jamais Savary presenciou isto com outros escritores. Fato único, pura emoção. 

Ao agradecer a homenagem, elogiou a postura profissional da PoeArt Editora, na pessoa de seu titular, o poeta Jean Carlos Gomes, cuja poesia recebeu alvissareiro prognóstico, em vista da "distinta, qualificada e bem cuidada construção". Olga Savary é uma cara amizade que sempre tivemos, mas só agora passamos a usufruir, como uma raridade que guardamos para o futuro. 

> Vicente Melo é jornalista e integrante da AVL
(Academia Voltarredondense de Letras), cadeira nº 20

Por Jean Carlos Gomes  –  poearteditora@gmail.com

1 Comentário

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  • Tania Jamardo Faillace

    Prezado Vicente Melo
    Aproveito este meio para cumprimentá-lo por seu trabalho, e para mandar meu abraço saudoso para Olga Savary, que conheci há muitíssimos anos atrás, mas perdi totalmente o contato.
    Aliás, se você se dispuser e tiver meios de informar a Olga que eu muito gostaria de refazer esse contato (sou conterrânea de outra poeta que também não gostava de ser chamada poetisa, a Lara de Lemos), agradeço-lhe muito.
    Tania Jamardo Faillace
    jornalista e escritora de Porto Alegre, RS
    taniajfaillace@gmail.com
    (51) 3325.2769