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Reflexão

A questão da verdade

As trilhas de uma montanha chamada verdade

Colunistas  –  07/12/2019 21:12

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(Foto Ilustrativa)

A verdade seria uma espécie de montanha em que cada caminhante ao tentar atingir seu cume sempre buscaria um dos infinitos caminhos que abrangeria sempre a parcialidade do que a montanha é e do que encontramos ao longo do caminho escolhido

 

No texto anterior falo da exlética como um caminho capaz de promover um engajamento construtivo para além dos reducionismos que um ponto de vista dualista, conflitivo e disjuntivo, ou seja, dialético. Aponto a exlética como uma possibilidade de superação da dialética, mais adequado à visão transdisciplinar, sistêmica e complexa.

Apesar de utilizar o gancho metodológico oferecido pelo pensamento exlético, adoto premissas ontológicas e gnosiológicas pessoais, oriundas de uma série de construções que venho fazendo ao longo dos anos, desde que resolvi ancorar minha reflexão em uma abordagem antropológica filosófica, ou seja, pensando muitas questões fenomênicas a partir de uma filosofia do homem. A abordagem que adoto pretende equacionar psicossociologicamente os fenômenos que tenho interesse a partir de um reposicionamento dos objetos sempre em relação ao que o homem é e como esse homem conhece o mundo.

Quando penso no homem, o situo como um ser multidimensional, mas em uma multidimensionalidade que se articula entre duas dimensões que não podem existir independentemente uma da outra. Assim, o homem é um ser material em toda a animalidade e materidade bio-quimico-fisíca que essa condição abrange; mas é, ao mesmo tempo, um animal espiritual e noético, que possui uma inteligência capaz de equilibrar-se em níveis de realidade que vão desde a apreensão da coisa mesma até a criação de símbolos e conceitos para dar conta dos muitos níveis da realidade dada. Todas as demais condições humanas (social, cultural, histórica, individual, simbólica etc.) estariam contidas na articulação dessas duas condições que não poderiam existir uma sem a outra. Desse modo, a existência do homem estaria sempre condicionada à conjugação dessas duas dimensões, a material e a espiritual.

O homem, na medida que é um ser material/espiritual, há que se pensar no como esse ser que é conhece o mundo. Nesse sentido, o conhecimento do mundo ao longo da história deu-se ora de modo realista por meio da afirmação de que há precedência do mundo objetivo sobre a cognição humana; e ora de modo idealista em que a afirmação de que mundo material, objetivo, exterior só pode ser compreendido em plenitude a partir de uma verdade mental, espiritual ou subjetiva. Tanto a postura realista quanto a idealista, consideradas isoladamente, induzem ao erro no processo de conhecimento, pois há objetos que precisam ser compreendidos à luz de uma postura gnosiológica que abarque tanto a realidade quanto a idealidade das coisas.

Nesse sentido, a verdade seria uma espécie de montanha em que cada caminhante ao tentar atingir seu cume sempre buscaria um dos infinitos caminhos que abrangeria sempre a parcialidade do que a montanha é e do que encontramos ao longo do caminho escolhido. A única possibilidade de conhecer a montanha em sua integridade seria atingir o seu cume (se é que há cume) e lá conseguir observar todas as dimensões que envolvem a montanha, as vistas possíveis e as experiências que cada caminho até o gume enseja. Mesmo assim, faltaria aos homens do cume, a visão da parte da montanha que está imersa e alcança as profundidades escuras do oceano de onde ela emerge.

Dito isso, ao considerar que um determinado ponto de vista, seja ele científico, filosófico ou religioso, é o verdadeiro, e ao tentarmos impô-lo aos outros estamos agindo como uma espécie de colonizadores da razão alheia. A postura dialética pretende garantir que haja um "vencedor", ao passo que o argumento exlético assume que todos os pontos de vista são passíveis de serem verdadeiros e também conjecturais.

Na infinita biblioteca do conhecimento humano, qualquer sistema filosófico, qualquer doutrina ou qualquer argumento, por mais fundamentado que seja, sempre alcança a dimensão de uma pequena prateleira. Assim, seria arrogante impor sua prateleira como verdade, quando ela não passa de uma conjectura mais ou menos estruturada em relação as demais.

O desafio, penso eu, é adotar uma postura exlética sem cair no relativismo.

Noutra oportunidade avançaremos mais nessa questão. 

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Por Giovani Miguez  –  giovanimiguez@gmail.com

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