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Coronavírus (Covid-19)

O medo líquido em tempos de pandemia

São duas posturas extremas que no fundo guardam pontos em comum: o pavor da morte, sentimento passível a qualquer ser humano, e o anseio pela liberdade e segurança

Colunistas  –  12/07/2020 19:26

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(Foto Ilustrativa)

Medo: Posições extremas em nada contribuem para uma situação de pandemia na qual estamos experimentando

 

Começo esta nova troca de ideias destacando o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, que viveu no exílio até seu falecimento em 2017, na Inglaterra, e que defende a noção de que nossos tempos modernos podem ser caracterizados enquanto “uma Modernidade líquida”, identificando que desde as relações humanas e até mesmo a subjetividade encontram-se “liquefeitas”, “fluídicas” ou em outros termos, instáveis e efêmeras. O que pretendo refletir com vocês é que a partir deste mundo líquido, marcado pela globalização tecnológica, Bauman vai identificar o que denomina de “medo líquido” como algo cada vez mais intenso em nosso século XXI, pois tememos a violência das grandes metrópoles, o medo da crise econômica que leva ao desemprego, de ficarmos fora da possibilidade de consumir, o medo do diferente e muitos outros. Medos que não apresentam uma forma única e definida.

Formulo a seguinte questão para nossa reflexão: “Como a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) se encaixa nesse medo líquido, caso seja possível identificá-la com tal conceito?”

Penso que para tentar refletir sobre tal questão podemos destacar duas posições que foram e ainda são tomadas no contexto da pandemia: o Negacionismo identifica-se com o medo de não controlar o que pode acontecer o mudar tudo. Um medo referente à perda de um mundo estável. Um mundo controlável. A demonstração atemorizadora da liquidez da suposta normalidade estável. Há o medo da perda do mundo idealizado com a fluidez da estabilidade, seja social, econômica ou política. A não aceitação de que tudo é falível e efêmero, inclusive e principalmente a vida. Constrói-se uma realidade que possa determinar uma sensação de segurança, contra esse medo, o que pode levar e leva a atitudes de indiferença e irresponsabilidade com si mesmo e para com os outros. 

A outa postura denomino de Hipermedo: Aqui o medo é tamanho, que existe também um negacionismo, mas referente à possibilidade de um novo refazer ou recomeçar, já que não haverá mais possibilidade de vida ou aspirar por um futuro, pelo motivo de que sendo tudo passível de se perder na fluidez, representada no caso pela ameaça do novo coronavírus, nada mais faz sentido, a não ser esperar pelo término de tudo. Estabelece-se uma inação, pautada na certeza hipermedrosa de que tudo se perderá e não faz diferença agir.

São duas posturas extremas que no fundo guardam pontos em comum: o pavor da morte, sentimento passível a qualquer ser humano, e o anseio pela liberdade e segurança, um tipo de relação muito tensa em nossa atualidade. Talvez muito mais pela busca da segurança do que pela de liberdade.  Deve-se observar que tais posições extremas em nada contribuem para uma situação de pandemia na qual estamos experimentando. Então o medo é condenável?

De forma alguma. O medo, além de ser próprio de nossa condição natural, atua positivamente para a nossa preservação e cuidado. O problema é nos deixarmos ao mesmo tempo escravizar por ele ou criarmos uma personalidade de invulnerabilidade que não temos, negando exatamente nossos medos. Devemos aprender a lidar com eles, tarefa muito pouco fácil, porém que se faz necessária.

*Bauman, Z. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001.

*Bauman, Z. Medo Líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.             

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Por Rogério Luís da Rocha Seixas  –  rogeriosrjb@gmail.com

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