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Crônicas de Humor e Entrevistas Poéticas

Isabel Furini

isabelfurini@hotmail.com

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A teoria do doce de leite

Há abençoados com o doce de leite na poesia, nas artes plásticas, na música, no teatro; com certeza, você conhece no mínimo uma pessoa que ao nascer recebeu o doce de leite

Colunistas  –  31/07/2021 11:27

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(Foto Ilustrativa)

O doce de leite torna a vida muito mais fácil, faz milagres

 

De 1975 a 1980, eu morei em Medellin, na Colômbia. Lá tive alunos, amigos, sendo que alguns deles ainda me enviam e-mails e me parabenizam no aniversário e Natal. Outros, no entanto, nunca entraram em contato ou até já faleceram.

Entre eles, destaca-se a figura de minha amiga Ângela. Ela tinha 15 anos mais do que eu, e faleceu no começo dos anos 2000. Ângela tinha um contagiante senso do humor. Era confiante e ousada. Minha amiga era professora, dona de uma escola e com um senso de praticidade invejável! Sabia liderar pessoas e passava sobre os problemas com uma leveza que eu admirava.

Um dia, estávamos falando sobre as diferenças individuais. Algumas pessoas lutam para conseguir qualquer coisa que desejem na vida, enquanto outras parece que conseguem as coisas sem esforço. Na sua escola havia professoras dos dois tipos. Uma delas, Marilen, chamava a atenção porque conseguia o que queria. Por exemplo, em um final de ano ela comentou que gostaria de conhecer Barranquilla, cidade do litoral colombiano. O marido, que era contador, foi transferido por dois meses para ajudar no escritório dessa cidade. Em outra oportunidade, ela se apresentou para participar de um ciclo de palestras sobre literatura hispânica, que aconteceu no Equador. Professoras com mais experiência e mais currículo também haviam se candidatado. Mas no momento da entrevista quem se destacou foi a professora Marilen.

Eu comentei que parecia impossível que, com um currículo tão mínimo, conseguisse tanto. E Ângela falou:

- Penso que ela tem “doce de leite”.
- O quê? - Perguntei.
- Sim, “doce de leite”. - repetiu Ângela.
- Você não viu como é gostoso o doce de leite? Tudo mundo gosta. Algumas pessoas, ao nascer, recebem um pouco de doce de leite. Isso torna a vida desses afortunados muito mais fácil. Quando desejam alguma coisa elas lembram do doce de leite que receberam e o dom que ganharam faz milagres. Elas conseguem posições que outros, com mais capacidade, não conseguem. 

Lembrei-me do conto de Cortázar chamado “Histórias de Cronópios e de Famas”. Essa história é simbólica, e, como todo símbolo, pode ser aplicado em diferentes assuntos.

E estou escrevendo esta crônica porque há pouco tempo conheci uma poeta abençoada com o doce de leite ou, conheci uma fama, na linguagem de Cortázar. Sim, essa poeta é daquelas que nascem e recebem um pote enorme de doce de leite para a vida. Não lembro o nome dela, mas vou chamá-la de Felizarda. Entendamos, as Musas não lhe deram muita inspiração, mas não faz mal, ela tem o doce de leite para compensar.

Felizarda foi convidada para uma Antologia, na qual foram deixadas de lado grandes poetas da atualidade. Uma honraria, não sei os detalhes, mas a mulher do doce de leite foi agraciada com uma medalha… Esclareço que ela não é jovem e escreve há poucos anos. Não é muito boa na arte da Poesia.  Só pode haver uma explicação: o doce de leite.

Também conheci abençoados com o doce de leite nas artes plásticas, na música, no teatro. E com certeza você, querido leitor, conhece no mínimo uma pessoa que ao nascer recebeu o doce de leite. São aqueles que trabalham sem realizar muito esforço e não são brilhantes, mas, de repente, deixam para trás os mais capacitados, sendo promovidos para um cargo de chefia, por exemplo.

Como dizia a minha amiga Ângela, o doce de leite faz milagres! 

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Por Isabel Furini  –  isabelfurini@hotmail.com

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