
(Fotos: Jean Carlos Gomes)
"Aprendi a não exagerar nas expectativas,
mesmo mantendo objetivos claros, palpáveis
e, sobretudo, factíveis"
Thereza Salgado Lootens y Gil nasceu na cidade de São Paulo, onde seus pais se refugiavam da ditadura de Getúlio Vargas (seu pai, um eterno democrata). Era o ano de 1939, dia 11 de março. Aos cinco meses voltaram ao Rio de Janeiro, onde residiu até os 8 anos, tendo então vindo para Vargem Alegre, onde os efeitos da Segunda Guerra Mundial não se faziam sentir tão gravemente, principalmente no que diz respeito a alimentos frescos e ausência de controle das quantidades adquiridas pelas famílias. Nessa Vila fez o que faltava para o término do então curso primário no grupo escolar. Fez-se necessário viajar diariamente nos antigos trens de passageiros da Central do Brasil, para completar o ginasial e o curso normal, que não tinham escolas em Vargem Alegre.
Casando-se aos 19 anos com Carlos Chermont, foi para Dorândia onde seguiria com as atividades de professora primária. Percebe-se, em tudo que diz respeito à educação, denominações já de muito substituídas. Mas os dois filhos (Carlos Alberto Lootens Chermont, 52, e Norma Chermont-Labayen, 49) cresceram e demandaram cidade maior onde pudessem estudar e, atendendo a isso, foram residir em Barra do Piraí. Nesse tempo estava fazendo o curso de pedagogia, na então Sobeu, onde se formou, sendo capacitada para a orientação educacional e ensino de algumas disciplinas do segundo grau.
Uma nova mudança
O divórcio ocorrido em 1977 levou-a a uma nova mudança, foi para Barra Mansa. Lá, continuou suas atividades como chefe do Departamento de Recursos Audiovisuais, na Sobeu. Tem grande afeto pela Sobeu, que lhe deu grandes oportunidades de crescimento. Mas as necessidades financeiras fizeram com que optasse em fazer um concurso para alcançar um cargo na CSN, o que se tornou realidade, felizmente. Ali conheceu seu marido, Jocelym Gil, que morreu há dois anos e meio, após mais de 30 anos de convívio. Volta Redonda ofereceu ao seu marido o problema da poluição e seu organismo não poderia manter-se aqui. Por sete anos e meio residiram em Valença, cidade hospitaleira onde fez grandes e inesquecíveis amizades. De volta a Volta Redonda, aqui se mantenho sem qualquer intenção de mudar sua vida e sua residência.
Sua constante atração pelo ensino teve sequência na CSN, onde atuou no treinamento de pessoal, desde os cargos operacionais aos gerenciais. Aí teve oportunidade de produzir, junto a colegas de alto gabarito profissional, alguns projetos vitoriosos em suas aplicações, até a sua aposentadoria há quase 22 anos. Por essa mesma atração, passou a dar cursos de pintura e artesanato como voluntária na Casa Espírita A Caminho da Luz, onde também foi palestrante. Sente prazer em participar de algumas ações sociais, pois seu amor aos seres vivos demanda-se isso. Propaga as ações da ONG Vira-Lata e da Sociedade de Proteção de Animais, está sempre alinhada com qualquer campanha que vise garantir-lhes os direitos.
Dedicação ao abrigo VIH-VER
Os poucos dias que se dedica ao abrigo VIH-VER são muito estimulantes e sempre agradece esta oportunidade de trabalho. É uma oportunidade para convidar a todos para conhecerem aquela instituição e mesmo doarem quatro horas por semana como voluntários.
- Precisamos de gente - enfatiza.
Muito nova, aos 17 anos, participou pela primeira vez de uma exposição de pintura, no Barra Tênis Clube. Desde então, a paixão pelas formas e cores tem lhe acompanhado, levando-a a várias outras exposições em Volta Redonda, no Rio (pintura em porcelana) e Paty do Alferes, tendo alcançado algumas medalhas e prêmios. Mas a arte está viva nela, por meio de outras expressões, como a música. Na juventude tiveram até a bondade de a considerarem uma "virtuose" do piano. Mas isso era difícil naquela época (1957, mais ou menos, e em vilarejo com poucos recursos), em termos de busca de caminhos mais altos e rentáveis, o que era a sua necessidade também. E o piano deu lugar às atividades como professora. Mas a música foi, talvez, a sua maior vocação.
O encontro com a poesia, aos 28 anos
"Apenas por volta do ano 1979 fui entusiasmada a publicar
meus trabalhos por representantes do Grebal, que romperam
a minha timidez e me fizeram acreditar que podia"
Por volta dos 28 anos, a poesia começou a fazer-se presente nela, quando escreveu seu primeiro poema: "A busca", em que comparava o vento e seu andar constante e a busca do ser humano por seus caminhos.
- Apenas por volta do ano 1979 fui entusiasmada a publicar meus trabalhos por representantes do Grebal (Grêmio Barramansense de Letras), que romperam a minha timidez e me fizeram acreditar que podia. Gratidão a eles, já falecidos - conta.
Hoje, este colunista e editor é quem lhe mantém na "certeza-ilusão" de ser poetisa, publicando seus versos nas antologias e coletâneas de minha responsabilidade, pela PoeArt Editora de Volta Redonda. Tem seus autores preferidos, embora encontre na poesia, sempre, muito prazer. Mário Quintana (Entre os Loucos, os Mortos e as Crianças, / É lá que eu canto, numa eterna ronda, / Nossos comuns desejos e esperanças!...), Cecília Meireles (Em que espelho ficou perdida a minha face?) e Daniel Lima (poeta revelação aos 95 anos) morto recentemente (...Abraão, meu santo andejo,/que, se por fora eu não ande, / por dentro eu não pare nunca!) são os que tocam seus sentimentos.
A beleza se faz necessária à sua vida
Pode estar pintando um acadêmico e logo em seguida
sentir-se atraída por uma expressão mais moderna
Qualquer forma de vida é necessária à sua vida. Como, portanto, abrir mão de amar a natureza em todas as suas expressões? São cores, linhas retas e curvas, luz e sombra. É a arte feita pelo Artista Maior, inconfundível, incomparável. Nela, não há exigência de técnicas, escolas, estilos. A natureza é a Arte Maior das maiores. Assim é que na pintura, embora faça algumas incursões pelos estilos mais modernos, prefere o que repete a arte do Criador, e a encontra de sobejo na escola flamenca em que, geralmente, saindo da sombra, projetam-se frutos, flores e pequenos animais, como borboletas, lavandeiras, abelhas, caramujos. Não aprecia os que trazem camundongos (risos). Todavia, obedecendo-se esta preferência por figuras bem explicitadas, ama os pintores de todas as escolas até o impressionismo, quando começa a fazer escolhas mais severas.
Pinta, então, de forma livre, sem escola que a defina, pois a sua definição está na emoção do momento. Pode estar pintando um acadêmico e logo em seguida sentir-se atraída por uma expressão mais moderna, mesmo que não seja esse o seu estilo preferido.
Na pintura, embora faça algumas incursões pelos estilos
mais modernos, prefere o que repete a arte do Criador
Três musas que encantam seus dias
Poesia, música e pintura. Três musas para encantarem os seus dias, como numa festa feérica.
- Eu gostaria que nossa forma de viver fosse mais poética, leve, doce; tivesse um colorido mais alegre, em que as sombras fossem substituídas por muita luz; mais harmoniosa como sons de violinos, ritmos de dança alegre e primaveril. Mas... Quanto mais lindo o sonho, mais dolorida a constatação da nossa realidade, em que seres humanos desrespeitam os direitos mínimos dos demais e, depois, fazem-se "caridosos" para ocultar a pobreza que não fizeram por diminuir nas ações que lhes estava nas mãos - comenta.
Nesses 74 anos de vida viu desfilarem à sua frente os atos mais ignóbeis e vergonhosos. Mentirosos que ganharam as páginas da história por meio de mentiras ou interpretações compradas. Mas viu, também, um Martin Lutter King, Gandhi, e tantos outros em busca de uma vida mais digna para todos. Aos ignóbeis, deixa o julgamento da Força Maior, o Juiz Maior (tenha Ele o nome que cada um lhe queira dar). Os bons "serão herdeiros da terra e do céu", assim crê. Deus é desejar diminuí-lo com palavras que serão sempre pequenas. Conforme escreveu meu pai Alberto Lootens: "Seria insano".
- Todavia, tenho certeza de que esta Imensa Força está sempre presente para você, desde que o ventre de sua mãe, Emília Salgado Lootens, recebeu os primeiros vestígios desta vida que viria - diz.
Uma vida cheia de paixões
A sua é uma vida cheia de paixões: as intangíveis - ou quase - como a arte e o ensino e as que fazem seus dias mais significativos: seus filhos, genro e nora (que conseguem amar a sogra!) suas três netas, seu neto, e cinco bisnetos. Mas também seus amigos e até quem não conhece pessoalmente, mas que merecem sua grande admiração e respeito. Mas, como todas as pessoas, também, tem frustrações. Não ter doado sangue (quando tinha idade, não tinha o peso mínimo exigido; agora tem o peso e passou da idade). Não ter tido coragem de adotar um filho depois de ter criado os seus. Não ter alcançado o nível que desejava como pianista.
A morte não lhe assusta, tem, antes, a certeza de que é uma das grandes Criações do Criador de Tudo. Não poderia dizer o mesmo, entretanto, do momento da morte cujas características e causas não conhecemos. Sofrer dá medo. Tem filhos, plantou árvores, falta agora, como sonha, ter um livro com seus trabalhos. Todavia, não é um projeto, pois aprendeu a não exagerar nas expectativas, mesmo mantendo objetivos claros, palpáveis e, sobretudo, factíveis.
Duas poesias para o nosso deleite...
Palavras
às vezes as palavras escorregam.
Não se firmam e não afirmam,
como se a vida fosse,
apenas,
lama escorregadia.
Deixam suas marcas,
mas não dizem,
não informam, não formam;
apenas,
passam cambaleantes.
às vezes as palavras se agarram
firmes e resolutas, impolutas,
como se na vida fossem,
numa ardente luta,
sempre,
sua arma, seu fogo.
Deixam ali suas marcas
de mentiras coloridas,
e verdades doloridas,
afinal,
deixando o som de passos fortes
batendo no chão.
Às vezes as palavras fogem:
no papel são provas irrefutáveis,
na boca, "leva-as o vento";
então,
fustigam como açoites,
mastigam com dentes de leão,
queimam como fogo de dragão.
Assim,
deixam marcas eternas.
As intenções? Ora, apenas doeu.
às vezes as palavras ficam,
no coração, na mente, suavemente,
com sabor de chocolate macio,
carinho, como amor ou perdão.
Deixam marcas doces, sem morte,
escorregando para dentro de nós,
como verdades coloridas,
arco-íris de felicidade.
O álbum de retratos
Olho um retrato,
outro e mais outro.
Alguns me fazem rir,
até mesmo gargalhar.
As páginas passeiam
nas minhas mãos enrugadas.
Há vezes em que tremem.
As emoções vagueiam na mente.
Onde foi isto? Quando?
Quem mais estava presente?
A saudade de quem se foi,
a gratidão, o perdão ou a mágoa.
E os sentimentos que emanam
deste momento de recordações,
retratam, com exata perfeição,
a minha verdadeira face.